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26/07/2020
O pecado da contracepção
A prática do sexo, com todas as aberrações que esta geração pós conciliar criou, jamais poderá estar acima do aspecto superior da geração de filhos para Deus. Até os documentos da boa Igreja pecam por não estabelecer isso com rigor doutrinal, diria a


xta-feira, 24 de julho de 2020

Contracepção: Releiamos a Humanae Vitae à luz da Casti Connubii

 

O Ocidente conheceu nas últimas décadas uma Revolução anti-familiar sem precedentes na História. Um dos pilares desse processo de desagregação da instituição familiar tem sido a separação dos dois fins primários do matrimónio, o procriativo e o unitivo.
 
O fim procriativo, separado da união conjugal, levou à fertilização in vitro e ao útero alugado. O fim unitivo, emancipado da procriação, levou à apoteose do amor livre, hetero e homossexual. Um dos resultados dessas aberrações é o recurso das parelhas de pessoas do mesmo sexo ao útero alugado para realizar uma grotesca caricatura da família natural.
 
A encíclica Humanae Vitae, de Paulo VI, cujo quinquagésimo aniversário será celebrado em 25 de Julho de 2018, teve o mérito de reafirmar a inseparabilidade dos dois significados do casamento e de condenar claramente a contracepção artificial, tornada possível nos anos 60 do século passado pela comercialização da pílula do Dr. Pinkus.
 
No entanto, até a Humanae Vitae tem culpa no cartório: a de não ter afirmado com igual clareza a hierarquia dos fins, ou seja, a primazia do fim procriativo sobre o unitivo. Dois princípios, ou valores, nunca podem estar num mesmo nível, em condição de igualdade. Um é sempre subordinado ao outro.
 
Isto acontece nas relações entre a fé e a razão, a graça e a natureza, a Igreja e o Estado, e assim por diante. Essas são realidades inseparáveis, mas distintas e ordenadas hierarquicamente. Se a ordem dessas relações não for definida, as tensões e os conflitos se seguirão, até a inversão da ordem dos princípios. Deste ponto de vista, uma das causas do processo de desintegração moral dentro da Igreja foi a falta de uma definição clara do fim primário do casamento pela encíclica de Paulo VI.
 
A doutrina da Igreja sobre o casamento foi afirmada como definitiva e obrigatória pelo Papa Pio XI na sua encíclica Casti Connubii, de 31 de Dezembro de 1930. Neste documento, o Papa recorda à Igreja e à Humanidade as verdades fundamentais sobre a natureza do casamento, estabelecido não pelos homens, mas pelo próprio Deus, e sobre as bênçãos e benefícios que advêm daí para a sociedade.
 
O primeiro objectivo é a procriação: que não significa apenas trazer filhos ao mundo, mas educá-los intelectual e moralmente, e, acima de tudo, espiritualmente, para conduzi-los ao seu destino eterno que é o Céu. O segundo objetivo é a assistência mútua entre os cônjuges, que não é apenas material, nem tampouco sexual ou sentimental, mas antes de tudo uma assistência e uma união espiritual.
 
A encíclica contém uma condenação clara e vigorosa do uso de meios contraceptivos, definidos como “uma acção torpe e intrinsecamente desonesta”. Portanto: “Qualquer uso do casamento em que pela maldade humana o acto seja destituído da sua virtude procriadora natural, vai contra a Lei de Deus e da natureza e aqueles que ousam cometer tais acções se tornam responsáveis de culpa grave.”
 
Pio XII confirmou em muitos discursos o ensinamento do seu antecessor. O esquema original sobre a família e o casamento do Concílio Vaticano II, aprovado por João XXIII em Julho de 1962, mas rejeitado no início dos trabalhos pelos Padres Conciliares, reafirmou essa doutrina, condenando explicitamente “teorias que invertem a ordem correcta dos valores, colocam o fim primordial do matrimónio no segundo plano em relação aos valores biológicos e pessoais dos cônjuges e que, na mesma ordem objectiva, indicam o amor conjugal como fim primário” (nº 14).
 
O fim procriativo, objectivo e enraizado na natureza cumpre-se espontaneamente. O objectivo unitivo, subjectivo e baseado na vontade dos cônjuges pode desaparecer. A primazia do fim procriativo salva o casamento, a primazia do fim unitivo o expõe a sérios riscos.
 
Além disso, não devemos esquecer que os fins do casamento não são dois, mas três, porque subsidiariamente existe também o remédio para a concupiscência. Ninguém fala deste terceiro fim, porque se perdeu o significado da noção de concupiscência, confundido muitas vezes com o pecado, à maneira luterana.
 
A concupiscência, presente em todos os homens, excepto na Santíssima Virgem, imune do pecado original, recorda-nos que a vida na Terra é uma luta incessante, porque, como diz São João, “no mundo não existe se não concupiscência da carne, concupiscência dos olhos e orgulho da vida” (1 Jo 2, 16).
 
A exaltação dos instintos sexuais, inoculados na cultura dominante pelo marxismo-freudismo, não é senão a glorificação da concupiscência e, consequentemente, do pecado original.
 
Essa inversão dos fins matrimoniais, que conduz inevitavelmente à explosão da concupiscência na sociedade, aflora na exortação do Papa Francisco Amoris Laetitia, de 8 de Abril de 2016, em cujo o número 36 se lê: “Com frequência apresentamos o casamento de modo tal que o fim unitivo, o convite a crescer no amor e o ideal de ajuda mútua permanecem à sombra de uma nota quase exclusiva sobre o dever de procriar.”
 
Estas palavras repetem quase literalmente aquelas pronunciadas pelo cardeal Leo-Joseph Suenens na aula conciliar, em 29 de Outubro de 1964, num discurso que escandalizou Paulo VI. “Pode ser – disse o cardeal arcebispo de Bruxelas – que tenhamos acentuado a palavra da Escritura: ‘Crescei e multiplicai’ a ponto de deixar a outra palavra divina nas sombras: ‘Os dois serão uma só carne’. (…) Caberá à Comissão dizer se não enfatizámos muito o primeiro objectivo, que é a procriação, em detrimento de um fim igualmente imperativo, que é o crescimento da unidade conjugal”.
 
O cardeal Suenens insinua que a finalidade principal do casamento não é crescer e multiplicar, mas que “os dois sejam uma só carne”. Passamos de uma definição teológica e filosófica para uma descrição psicológica do casamento, apresentada não como um vínculo enraizado na natureza e dedicado à propagação da humanidade, mas como uma comunhão íntima, voltada para o amor recíproco dos cônjuges.
 
O casamento é reduzido mais uma vez a uma comunhão de amor, enquanto o controle de natalidade – natural ou artificial – é visto como um bem que merece ser encorajado sob o nome de “paternidade responsável”, pois ajuda a fortalecer o bem primário da união conjugal. A consequência inevitável é que, no momento em que essa comunhão íntima vier a fracassar, o casamento pode se dissolver.
 
A inversão dos fins é acompanhada pela inversão dos papéis dentro da união conjugal. O bem-estar psicofísico da mulher substitui sua missão de mãe. O nascimento de uma criança é visto como um elemento que pode perturbar a íntima comunhão de amor do casal. A criança pode ser considerada como um injusto agressor do equilíbrio familiar, da qual o casal se defende com a contracepção e, em casos extremos, com o aborto.
 
A interpretação que demos das palavras do cardeal Suenens não é forçada. Em coerência com aquele discurso, o cardeal primaz da Bélgica liderou em 1968 a revolta dos bispos e teólogos contra a Humanae Vitae. A Declaração do episcopado belga, de 30 de Agosto de 1968, contra a encíclica de Paulo VI, foi, com a do episcopado alemão, uma das primeiras elaboradas por uma Conferência Episcopal e serviu de modelo de protesto a outros episcopados.
 
Aos herdeiros dessa contestação, que se propõem reinterpretar a Humanae Vitae à luz da Amoris Laetitia, respondemos com firmeza que continuaremos a ler a encíclica de Paulo VI à luz da Casti Connubii e do Magistério perene da Igreja.
 
Roberto de Mattei in Corrispondenza Romana
Tradução: Hélio Dias Viana – FratresInUnum.com

 


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