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Eucaristia
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19/06/2021
Aprendendo sobre a Santa Missa
Como e sabe, hoje há uma luta terrível do anticristo e seus servos para acabar com a Santa Missa. De modo agora ostensivo, o que antes era camuflado, os filhos do demônio tentam acabar com o Santo Sacrifício. Bom, pois, é estudar para compreender. Se derrubassem todos os sacrários da terra em minutos os demônios nos matariam a todos... O que nunca conseguirão!


O que é a Santa Missa?

A Santa Missa é a renovação e a re-presença 234 [no sentido de novo modo de presença] do Sacrifício da Cruz. Por intermédio do padre, Cristo oferece ao Pai, de maneira incruenta; isto é, não sangrenta, Seu Corpo e Seu Sangue, que havia imolado de modo cruento; isto é, sangrento, na Cruz. A Missa é, pois, um verdadeiro Sacrifício, pelo qual os méritos do Sacrifício da Cruz nos são aplicados.

Onde se pode encontrar o ensinamento da Igreja?

O Concílio de Trento ensina:
“Na Última Ceia, “a noite quando fora entregue” (1Cor 11,23), Cristo quis deixar à Igreja, Sua Esposa bem-amada, um Sacrifício visível (como convém à natureza humana), pelo qual o Sacrifício cruento, que devia cumprir-se uma vez por todas sobre a Cruz, seria tornado presente e comemorado235 até o fim dos tempos, e teria sua virtude salvífica aplicada para a remissão dos pecados que cometemos a cada dia; por isso, (…) ofereceu, a Deus Pai, Seu Corpo e Seu Sangue, sob as espécies do pão e do vinho.”236

É correto que a Missa seja verdadeiramente um sacrifício em sentido próprio?

O Concílio de Trento é formal:

“Aquele que disser que, na Missa, não é oferecido a Deus um sacrifício verdadeiro e real (…); seja anátema !”237

O mesmo Concílio declarou que, por Suas palavras: “Fazei isto em memória de Mim”, Cristo deu aos Apóstolos o Sacerdócio e o poder de celebrar este Sacrifício.238

Qual é precisamente a relação entre o Sacrifício da Missa e o da Cruz?

O Sacrifício da Missa tem a mesma vítima, o mesmo sacerdote e as mesmas intenções do da Cruz. É o mesmo Sacrifício; mas oferecido de uma maneira diferente.239

Qual é a vítima do Sacrifício da Missa?

Nosso Senhor Jesus Cristo é a vítima do Sacrifício da Missa, como também do da Cruz. É Ele que é essencialmente oferecido na Missa, e não o pão e o vinho (que cessam de existir na Consagração).

Pode-se dizer que Nosso Senhor está presente na Santa Eucaristia enquanto vítima?

Sim, é enquanto vítima que Nosso Senhor Jesus Cristo está presente na Santa Eucaristia.

Como Nosso Senhor, cujo Corpo é, doravante, glorioso, pode estar presente em estado de vítima?

Nosso Senhor está em estado de vítima na Santa Eucaristia, porque o Seu Corpo e o Seu Sangue, nela, são sacramentalmente separados, e, porque esta separação sacramental tem por objetivo representar a separação física realizada pela Paixão.

Nosso Senhor não está, entretanto, presente todo inteiro – com Seu Corpo, Seu Sangue, Sua Alma e Sua Divindade – tanto sob as aparências do pão quanto sob as do vinho?

Nosso Senhor Jesus Cristo estando, hoje, vivo (ressuscitado e glorioso); a presença de Seu Corpo ou de Seu Sangue implica, necessariamente, a de toda Sua Pessoa (Corpo, Sangue, Alma e Divindade). Seu Corpo e Seu Sangue não podem mais estar fisicamente separados. E, todavia, em si, por força das palavras consecratórias, é o Corpo que se torna presente sob as aparências do pão, e o Sangue, sob as do vinho. O Corpo e o Sangue de Cristo estão, então, de um certo modo, separados pelo Sacramento (por causa da dupla Consagração).

Essa separação sacramental do Corpo e do Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo constitui uma imolação?

A separação sacramental do Corpo e do Sangue de Nosso Senhor constitui uma imolação, enquanto representa a separação física que aconteceu durante Sua Paixão, e enquanto, por vontade de Nosso Salvador, aplica os frutos desta.

Há então na Missa uma imolação mesmo?

Há, na Missa, uma imolação; mas sacramental. O Concílio de Trento afirma que, na Missa, Cristo “está contido e imolado de forma não sangrenta”240

Qual é o sacerdote do Sacrifício da Missa?

O verdadeiro sacerdote do Sacrifício da Missa é, como sobre a Cruz, Nosso Senhor Jesus Cristo. A única diferença é que Cristo ofereceu-Se a Si mesmo sobre a Cruz; enquanto que se serve, na Missa, de um sacerdote humano, que age como instrumento de Cristo.

Quais são as intenções do Sacrifício da Missa?

Assim como o Sacrifício da Cruz, o Sacrifício da Missa é oferecido por Nosso Senhor em quatro grandes intenções: adorar a Deus, agradecer-lhe por Suas bênçãos; reparar as ofensas que Lhe foram feitas (neste último sentido, o Sacrifício é dito propiciatório ou satisfativo), e obter Suas Graças para os homens.

Em que o Sacrifício da Missa é oferecido de modo diferente do da Cruz?

Sobre a Cruz, Cristo imolou-Se de modo cruento, isto é, sangrento; na Missa, Cristo o faz de modo incruento, isto é, não sangrento.

Essa doutrina é a dos Padres da Igreja?

Santo Agostinho ensina:

“Cristo foi imolado uma só vez em Si mesmo; e, todavia, é imolado, todos os dias, no Sacramento”.241

E Santo Ambrósio:

“Do mesmo modo que, com efeito, por toda parte, é oferecido um único Corpo [de Cristo] e não vários; assim também um único Sacrifício.” 242

Quem negou que a Missa é um Sacrifício?

Durante mais de mil anos, ninguém ousou negar que Missa é um Sacrifício. Os católicos gozaram, pacificamente, dessa Verdade. Só foi no século XII que algumas seitas começaram a atacá-la. Mas foi, sobretudo, Martinho Lutero e o protestantismo, que levaram numerosos cristãos a rejeitar aquele dogma.

Como Deus nos revelou que a Missa é um Sacrifício?

O fato de que a Missa seja um Sacrifício decorre, claramente, da Sagrada Escritura. No Antigo Testamento, Deus, por intermédio do profeta Malaquias, anunciava nestes termos um Sacrifício vindouro:

“Do nascer ao pôr-do-sol, Meu Nome é grande entre as nações; e, em toda parte, um Sacrifício de agradável odor é apresentado, em Meu Nome, como oblação pura” (Ml 1,11).

O que há de notável nessa profecia de Malaquias?

Os Judeus somente tinham o direito de oferecer sacrifícios em um único lugar: o Templo de Jerusalém. Ora, o profeta anuncia uma oblação pura, que será celebrada em todos os lugares do mundo. Desde a origem, os cristãos reconheceram aí o Sacrifício da Missa.

Há, no Antigo Testamento, outros anúncios do Sacrifício da Missa?

O Sacerdócio de Cristo é prefigurado, no Antigo Testamento, pelo de Melquisedec (São Paulo diz que Jesus Cristo é “Sacerdote segundo a ordem de Melquisedec”)243. Ora, Melquisedec somente é mencionado na Bíblia por ter oferecido um Sacrifício de pão e vinho (Gn 14,18). É uma figura do Sacrifício da Missa, instituído por Nosso Senhor e cumprido sob as espécies do pão e do vinho.

Os Evangelhos falam da Missa como de um Sacrifício?

Quando da Instituição da Missa, na Quinta-Feira Santa, Cristo utilizou termos referindo-se a um Sacrifício: “Meu Corpo entregue por vós”244 – “Meu Sangue, Sangue da Nova Aliança, derramado por muitos para a remissão dos pecados”245.

Podem-se citar ainda outras passagens da Sagrada Escritura?

Na primeira carta aos Coríntios, São Paulo opõe “a mesa dos demônios” à “mesa do Senhor” (1Cor 10,18-21). Como a expressão “mesa dos demônios” designa os sacrifícios pagãos oferecidos aos ídolos, a expressão “mesa do Senhor” designa, pois, o Sacrifício cristão.

Do mesmo modo, a carta aos Hebreus afirma: “Nós temos um altar, do qual, não têm direito de comer, aqueles que permanecem no serviço da tenda [= o culto judaico]” (Hb 13, 10). Ora, um altar é feito, por definição, para oferecer um sacrifício.

O que dizem da Missa os primeiros Padres da Igreja?

Os mais antigos escritos eclesiásticos falam da Eucaristia como de um Sacrifício. Podem-se citar, entre muitos outros, a Didaché (cerca de 100 d.C), o Papa São Clemente ( + 101), São Cipriano de Cartago (+ 258).

O que a Didaché ensina?

A Didaché – um dos primeiros escritos cristãos – declara:

“Reuni-vos no Dia do Senhor, parti o pão e rendei graças depois terdes confessado vossos pecados, para que o vosso Sacrifício seja puro”246

O que disse o Papa São Clemente ?

São Clemente de Roma (Papa de 92 a 101) escreveu: “O Senhor prescreveu que os Sacrifícios e as ações litúrgicas sejam cumpridos em tempos e em horas precisas”247

Como São Cipriano de Cartago fala do Sacrifício da Missa?

São Cipriano de Cartago (+258) consagrou sua carta 63 ao Sacrifício da Missa. Afirma, nesta, que Cristo ofereceu Seu Corpo e Seu Sangue em Sacrifício ao Pai (n.4); que ordenou celebrar esse Sacrifício em memória Dele (n.14) e que o sacerdote age como representante de Cristo (n.9).

Podeis citar mais um Padre da Igreja sobre o Sacrifício da Missa?

São Gregório Nazianzeno (+390) exorta assim um sacerdote:

“Não cesse, homem de Deus, de rezar e de interceder por mim, quando fizeres descer o Verbo por tua palavra; quando separares, de maneira incruenta, a Carne e o Sangue do Senhor, quando tu te servires da palavra [ as palavras da Consagração] como de um gládio”.248

O que se destaca nessa passagem de São Gregório Nazianzeno?

São Gregório Nazianzeno menciona, de modo muito claro, a imolação incruenta de Cristo, realizada pela separação de Seu Corpo e de Seu Sangue, por meio da dupla Consagração.

O que se pode concluir de todas essas passagens da Sagrada Escritura e dos Padres da Igreja?

As passagens citadas, e ainda muitas outras, manifestam, à evidência, que não se pode negar que a Missa seja essencialmente um Sacrifício, sem trair o ensinamento de Cristo.

Essa Verdade do Sacrifício da Missa é de uma grande importância?

Todas as Verdades reveladas por Nosso Senhor Jesus Cristo são importantes, e nenhuma pode ser, impunemente, negligenciada. Mas o Sacrifício da Missa está, verdadeiramente, no coração de toda a vida cristã. Um erro sobre este ponto teria conseqüências catastróficas.

Como o Sacrifício da Missa está no coração da vida cristã?

A religião judaica do Antigo Testamento estava já centrada sobre os sacrifícios oferecidos no Templo. Seria surpreendente, se esses numerosos sacrifícios não tivessem correspondência no Novo Testamento. De fato, Nosso Senhor veio, essencialmente, para Se oferecer em Sacrifício a Seu Pai. Em nome de toda a humanidade, ofereceu esse Sacrifício perfeito de adoração, de ação de graças, de reparação pelo pecado e de impetração. O essencial de nossa vida cristã deve ser nos unirmos, dia após dia, a esse Sacrifício. Ora, é precisamente pela Missa que o fazemos.

Não se pode, pois, conceber o Cristianismo sem a Missa?

Mesmo na ordem natural, o sacrifício é um elemento essencial ao culto devido a Deus. Todas as religiões antigas tinham seus sacrifícios (uma das provas da caducidade da religião judaica é precisamente o fato de que, desde o ano 70 d.C – destruição do Templo de Jerusalém – esta não pode mais cumprir seus ritos sacrificiais). Na época moderna, os protestantes tentaram inventar um Cristianismo sem Missa: é uma desnaturação completa da Fé e da Moral cristãs, que levou, muito rapidamente, ao filantropismo utópico contemporâneo. Quando o homem cessa de oferecer sacrifícios a Deus, tende rápido a se tomar por Deus.

Não é sobretudo a Presença real de Nosso Senhor na Eucaristia que é negada pelos protestantes?

Lutero não negava uma certa presença real de Cristo no Sacramento da Eucaristia; mesmo se a entendesse de modo herético. Por outro lado, rejeitava o ensinamento do Sacrifício da Missa e proferia a esse propósito as mais grosseiras injúrias.

O que Lutero dizia do Santo Sacrifício da Missa?

Lutero anunciava, claramente, que desejava destruir a Missa, para atingir o coração da Igreja Católica. Por exemplo:

“Quando a Missa for derrubada, penso que teremos derrubado o Papado, pois é sobre a Missa, como sobre uma rocha, que se apóia o Papado todo inteiro, com seus mosteiros, suas dioceses, suas universidades, seus altares, seus ministros e sua doutrina (…); tudo isso se esfarelará, quando se esfarelar a sua Missa sacrílega e abominável.”249

Lutero não admitia, todavia, que a Missa pudesse, em algum sentido, ser chamada de Sacrifício?

Lutero admitia e empregava, às vezes, o termo “sacrifício”, para designar a Missa; mas somente em um sentido muito lato (“uma coisa sagrada”). Recusava obstinadamente que a Missa fosse um Sacrifício em sentido próprio:

“O elemento principal de seu culto, a Missa, supera toda impiedade e toda abominação; dela fazem um sacrifício e uma boa obra.”250

O que é a Missa para Lutero então?

Para Lutero, a Missa é somente um simples memorial da Paixão. Seu objetivo é instruir os fiéis; lembrar-lhes do Sacrifício do Calvário, para provocar o ato interior de fé. Se fala de sacrifício, é unicamente no sentido de sacrifício de louvor ou de ação de graças, sem valor redentor.

O que é que Lutero recusa de modo absoluto na doutrina católica sobre a Missa?

O que Lutero recusa de modo absoluto, é que a Missa tenha um valor propiciatório ou satisfativo – isto é, que aplique, de modo atual e eficaz, a nossas almas, os frutos do Sacrifício da Cruz, e que, assim, quite a dívida que temos para com Deus, por causa de nossos pecados.

O que significam precisamente as palavras “propiciatório” e “satisfativo”?

O Sacrifício da Missa é dito propiciatório, porque torna a Deus propício em relação a nós, destruindo os motivos de cólera que pudesse ter para conosco, por causa de nossos pecados. É dito satisfativo porque satisfaz à Justiça divina, isto é, que faz o bastante (satis facere = fazer o bastante) para apaziguá-lo.

O que diz Lutero precisamente sobre esse assunto?

Lutero ensina:

“A Missa não é um sacrifício ou a ação de um sacrificador. Olhemo-la como Sacramento ou como Testamento. Chamemo-la bênção, eucaristia, ou memória do Senhor”.251

“O Santo Sacramento não foi instituído para que dele se faça um sacrifício expiatório (…) mas para que sirva para despertar a fé em nós, e para reconfortar as consciências; (…) a Missa não é um sacrifício oferecido para os outros, sejam vivos ou mortos, para apagar seus pecados; mas (…) uma comunhão em que padre e fiéis recebem o Sacramento, cada um para si mesmo”.252

“É um erro manifesto e ímpio oferecer ou aplicar a Missa aos pecados, na qualidade de satisfação, ou em favor dos defuntos (…).”253

Quais são as conseqüências litúrgicas dos erros de Lutero sobre a Missa?

Para Lutero, a “Liturgia da Palavra” deve tomar o primeiro lugar, e a comunhão, o segundo. Modificando, progressivamente, os ritos e as cerimônias tradicionais da Missa, Lutero quis incitar, pouco a pouco, os fiéis a mudarem a sua Fé. Mas aconselhou não agir muito rápido:

“Para chegar segura e felizmente ao objetivo, é preciso conservar algumas cerimônias da antiga missa para os fracos que poderiam ficar escandalizados pela mudança muito brusca.”254.

Os protestantes impuseram, pois, voluntariamente sua nova crença de modo dissimulado, modificando, pouco a pouco, a Liturgia?

Os anglicanos, sobretudo, adotaram essa estratégia dissimulada255. Mas Lutero a havia anunciado de maneira muito clara:

“O padre pode muito bem arranjar-se de tal modo que o homem do povo ignore sempre a mudança operada e possa assistir à Missa, sem encontrar de que se escandalizar”.256

Quais mudanças Lutero introduziu na Liturgia?

Lutero combateu, sobretudo, o Ofertório – que fez desaparecer – e o Cânon – que modificou consideravelmente. Conservou o quadro geral da Missa; mas apagou, habilmente, o essencial. No Natal de 1521, o culto luterano se apresentava assim: confiteor; intróito; kyrie; gloria; epístola; evangelho; pregação – (não havia Ofertório); sanctus; relato em língua vulgar e em voz alta da instituição da Ceia; comunhão sob as duas espécies (na mão e no cálice) sem necessidade de uma prévia confissão; Agnus Dei; Benedicamus Domino. O latim só desapareceu pouco a pouco.

O que se pode dizer do ódio com que Lutero perseguia a Missa católica?

Lutero enxergou bem um ponto: toda a vida cristã repousa sobre o Sacrifício do Calvário renovado de modo incruento sobre o altar. Desnaturar a Missa é um dos meios mais eficazes para destruir a Igreja. Vários autores católicos destacaram que esta seria a obra do Anticristo.

Podeis citar algum desses autores?

Santo Afonso de Liguório advertiu gravemente:

“A Missa é o que há de mais belo e de melhor na Igreja (…) Também o demônio sempre procurou, por meio dos hereges, privar o mundo de Missa, fazendo-lhes precursores do Anticristo.” 257

Dom Guéranger previne do mesmo modo:

“Se o Sacrifício da Missa se apagasse, não tardaríamos a recair no estado depravado em que se achavam os povos manchados pelo paganismo, e essa será a obra do Anticristo. Tentará todos os meios para impedir a celebração da Santa Missa, para que esse grande contrapeso seja abatido, e que Deus ponha fim, então, a todas as coisas, não tendo mais motivo para as fazer subsistirem.”258

A Sagrada Escritura anuncia que o Anticristo combaterá o Sacrifício da Missa?

O profeta Daniel anunciou, sobre o tema do Anticristo:

“O poder lhe será dado contra o Sacrifício perpétuo por causa dos pecados”259

O ensinamento da Igreja sobre o Sacrifício da Missa diminui a importância do Sacrifício do Calvário?
O Sacrifício da Missa não diminui de nenhum modo a importância do Sacrifício da Cruz, pois depende totalmente deste e funda neste toda a sua eficácia. Todo seu valor consiste em torná-lo presente, comemorando-o, e, em aplicar, aos homens, as Graças que Cristo lhes mereceu sobre a Cruz.

Quem acusou o sacrifício da Missa de diminuir a importância do Sacrifício da Cruz?

Os protestantes acusaram o Sacrifício da Missa de ser um ultraje ao Sacrifício da Cruz. Segundo eles, os católicos acham que o Sacrifício da Cruz não bastou para a salvação da humanidade e que se tem, pois, necessidade permanente de outro sacrifício.

O que é preciso responder a essas acusações protestantes?

Os protestantes desconhecem totalmente o ensinamento da Igreja. Cristo mereceu sobre a Cruz todas as Graças necessárias para a Salvação de todos os homens de todos os tempos.260 O Sacrifício da Missa não é um outro Sacrifício que o da Cruz; mas o mesmo Sacrifício, tornado presente a todos os cristãos. Seu papel não é o de adquirir novas Graças; mas o de aplicar, aos homens, as Graças já merecidas sobre a Cruz.

Por que há assim necessidade do Sacrifício da Missa para nos aplicar as Graças merecidas sobre a Cruz?

Segundo a vontade de Cristo, a dispensação dos frutos da Redenção não é automática; mas está ligada aos Sacramentos: “Aquele que crer e for batizado, será salvo”(Mc 16,16); “Se não comerdes a Carne do Filho do Homem, e não beberem o Seu Sangue, não tereis, mesmo, a vida em vós mesmos” (Jo 6, 53).

Mas por que um Sacrifício é necessário para essa dispensação de frutos da Redenção?

A vida cristã é uma participação na vida de Cristo. Ora, Ele Se encarnou para poder oferecer em Sua Pessoa, e, em nosso nome, um Sacrifício perfeito a Seu Pai. O essencial da nossa vida cristã deve ser nos unirmos a esse Sacrifício de Cristo, conforme a palavra de São Paulo “Termino, em minha própria carne, o que falta aos sofrimentos de Cristo pelo Seu Corpo, que é a Igreja” (Cl 1, 24). Na Missa, a Igreja, o sacerdote e os fiéis unem continuamente sua vida ao Sacrifício de Cristo; dão-se a Ele; Nele procuram as Graças para se darem sempre mais.

A Santa Missa é também uma refeição?
Na sua essência mesma, a Missa não é uma refeição; nem uma refeição incluindo um sacrifício; mas simplesmente um Sacrifício. A Santa Comunhão, que se pode, no limite, chamar de refeição, é um fruto desse Sacrifício; mas não pertence à sua essência.

O que diz o Magistério da Igreja sobre o tema?

O Concílio de Trento afirma, claramente, que a Missa é um Sacrifício. Nunca diz que seria também uma refeição. A tese, segundo a qual a Santa Missa, em sua natureza essencial, seria, ao mesmo tempo, um Sacrifício e uma refeição, foi, explicitamente, condenada por Pio XII:

“Afastam-se, pois, do caminho da Verdade, aqueles que somente querem realizar o Santo Sacrifício quando o povo cristão se aproxima da Santa Mesa. E, afastam-se ainda mais aqueles que, pretendendo que é absolutamente necessário que os fiéis comunguem com o sacerdote, afirmam, perigosamente, que não se trata apenas de um Sacrifício; mas sim de um Sacrifício e de uma refeição de comunidade fraterna, fazendo da Comunhão realizada em comum o ponto culminante de toda a cerimônia.

É preciso, ainda mais uma vez, ressaltar que o Sacrifício eucarístico consiste, essencialmente, na imolação incruenta da Divina Vítima; imolação que é misticamente indicada pela separação das santas espécies e por sua oblação feita ao Eterno Pai. A Santa Comunhão assegura-lhe a integridade, e tem por finalidade, nela, fazer participar sacramentalmente; porém, enquanto que é absolutamente necessária da parte do ministro sacrificador, é somente vivamente recomendável aos fiéis.”261

Como se pode ver, na prática, que a Missa não é, essencialmente, uma refeição?

A Igreja mandou participar, todos os domingos, no Sacrifício da Missa; mas nunca obrigou os fiéis à Comunhão dominical. Se a Santa Missa fosse, essencialmente, uma refeição, os fiéis presentes deveriam todos comungar; pois aquele que assiste a uma refeição sem comer nada, nesta não tomou parte !!!

Pode-se, pois, participar, realmente, do Sacrifício da Missa, sem comungar?

Sim, pode-se participar muito realmente do Sacrifício da Missa sem comungar (mesmo se, evidentemente, a comunhão faz com que se participe muito mais). O Concílio de Trento precisou:

“Se alguém disser que as Missas em que só o sacerdote comunga são ilícitas e devem ser abolidas; seja anátema!” 262

Há outras provas de que a Missa não é, essencialmente, uma refeição?

O rito da Missa todo inteiro mostra que a Missa não é, essencialmente, uma refeição. Que refeição bem singular seria essa em que depois de longas cerimônias, acaba-se por receber um alimento tão pequeno ! Se a Missa fosse uma refeição, seriam aqueles que a querem organizar sob a forma de um verdadeiro almoço que teriam razão.

Quem ensina que a Missa é, ao mesmo tempo, um Sacrifício e uma refeição?
É hoje uma teoria difundida por numerosos teólogos “católicos” que a Missa é uma refeição, no curso da qual um Sacrifício se realiza. Seria, então, – dizem eles – antes uma refeição; mas que compreenderia também um Sacrifício, porque Cristo se dá a nós em alimento. É este dom que Cristo faz de si mesmo em uma refeição que daria à Missa seu caráter sacrifical.

Mas isso não tem nada a ver com a Teologia Católica, pois a realidade foi completamente deformada. O Sacrifício consiste em um oferecimento feito a Deus, e não aos homens. Sobre a Cruz, Cristo Se ofereceu a Seu Pai, e não a nós. Se essa nova teoria fosse verdadeira, o Sacrifício da Missa seria oferecido a nós, e não a Deus.

Onde se podem achar essas novas teorias sobre a natureza da Missa?

Essa teoria é sustentada, por exemplo, na Declaração comum da Comissão Mista católico-luterana, que trabalhou de 1976 a 1982.

Quais são os católicos que participaram dessa Comissão?

Dentre os católicos membros dessa Comissão, podem-se citar, entre outros, os futuros Cardeais Karl Lehmann e Walter Kasper, e os Cardeais Hermann Volk e Joseph Ratzinger.

O que diz a Declaração católico-luterana?

A Declaração católico-luterana afirma:
“O sinal sensível do oferecimento de Jesus Cristo na celebração da Eucaristia e o da nossa incorporação neste Sacrifício é (…) a refeição (…). Isso significa que, na realização desta refeição, o Sacrifício de Nosso Senhor Jesus Cristo é tornado presente e realizado. É por isso que a distinção tradicional, que somente se tornou habitual depois do Concílio de Trento, segundo a qual se distingue, na Eucaristia, de um lado o Sacramento, e de outro, o Sacrifício; não pode ser retida pela Teologia, pois ela falsifica sua estrutura fundamental. É no fato de se oferecer em alimento que o Sacrifício de Jesus Cristo encontra sua expressão em nível litúrgico.”263

O que se pode dizer desse ensinamento?

Trata-se, verdadeiramente, de um ensinamento novo, que implica a rejeição da teologia tradicional. Deve ser, pois, firmemente recusado.

A Missa Tridentina foi abolida?
Desde 1969, data da introdução da Missa nova (a Missa de Paulo VI), esforçou-se por fazer crer que a Missa tradicional havia sido abolida e proibida. Mas, em seu Motu Proprio Summorum Pontificum (07 de julho de 2007), o Papa Bento XVI reconheceu publicamente que a Missa tridentina nunca havia sido abolida. Todos aqueles que haviam sido acusados de desobediência e perseguidos, durante quase quarenta anos, por causa de sua fidelidade a esta Missa, sofreram, pois, perseguição por causa da justiça.

A Missa tradicional podia ser abolida?

A Missa tradicional podia dificilmente ser proibida, pois a Igreja sempre respeitou os ritos multisseculares, em vez de tentar proibi-los. Ademais, São Pio V, tendo promulgado o Missal tridentino (pela Bula Quo primum tempore de 14 de julho de 1570), havia outorgado um privilégio perpétuo, segundo o qual, nenhum padre poderia jamais ser impedido de ser fiel a este rito para celebrar a Missa.

As decisões da Bula Quo primum tempore de São Pio V não foram abolidas pela Constituição Apostólica Missalem romanum de Paulo VI (03 de abril de 1969), promulgando a Missa nova?

É difícil determinar o alcance jurídico exato da Constituição Missalem romanum de Paulo VI, por causa das ambigüidades que contém. O que é seguro é que não pretendia abolir o privilégio outorgado por São Pio V. Os defensores da Missa tradicional viram isso e disseram-no imediatamente; mas os Bispos, e mesmo o Papa Paulo VI, procuraram fazer crer que a Missa nova era obrigatória.

Foi preciso, pois, esperar quase quarenta anos para que Roma percebesse que a Missa tradicional não estava abolida?

As autoridades romanas sabiam exatamente, ao menos desde 1986, que a Missa tradicional não havia sido abolida. Mas, foi preciso esperar ainda mais de vinte anos para que a coisa fosse tornada oficial. O Cardeal Stickler contou:

“Em 1986, o Papa João Paulo II fez duas perguntas a uma comissão de nove Cardeais. Primeiramente: “O Papa Paulo VI ou uma outra autoridade competente proibiu a celebração, em nossa época, da Missa tridentina?” A resposta dada por oito dos nove Cardeais, em 1986, foi: Não, a Missa de São Pio V nunca foi proibida. Posso dizê-lo, pois eu era um dos Cardeais. Houve também uma outra pergunta interessante: “Um Bispo pode proibir a um padre que tenha boa reputação de continuar a celebrar a Missa tridentina?”. Os nove Cardeais foram unânimes em dizer que nenhum Bispo poderia proibir a um padre católico de celebrar a Missa tridentina. Não há proibição oficial e eu creio que o Papa nunca trará alguma…justamente por causa das palavras de São Pio V, que disse que esta Missa valia perpetuamente.”264

O novo rito da Missa é uma expressão adequada do ensinamento católico sobre o Sacrifício da Missa?
Conforme o juízo dos Cardeais Ottaviani e Bacci, o novo rito da Missa, promulgado em 1969, “distancia-se, de modo impressionante, no todo, como no detalhe, da teologia católica da Santa Missa.”265. Todas as mudanças tendem a silenciar o Sacrifício propiciatório, para se aproximar da Ceia protestante.

Como, concretamente, a Missa nova se aproxima da Ceia protestante?

As mudanças mais graves são as que tocam ao Ofertório e ao Cânon. Pode-se dizer que as reivindicações de Lutero, que pediam a abolição do Ofertório e do Cânon foram, substancialmente, satisfeitas no Novo Ordo.

O que dizia Lutero do Ofertório?

Lutero afirmava:

“Essa abominação (…) que se chama Ofertório. É daí que quase tudo ressoa e faz sentir vivamente o Sacrifício.”266

Por que Lutero odiava tanto o Ofertório da Missa?

O antigo Ofertório exprime, claramente, que a Missa é um Sacrifício de propiciação pelos pecados. O sacerdote reza assim:

“Recebei, Pai Santo, Deus Onipotente e Eterno, esta Hóstia imaculada, que eu, Vosso indigno servo, ofereço-Vos, a Vós, meu Deus vivo e verdadeiro, pelos meus inumeráveis pecados, ofensas e negligências; por todos os que estão aqui presentes e por todos os fiéis, vivos e defuntos; para que tanto a mim, como a eles, aproveite para a salvação e vida eterna. Amém.”

O que virou esse Ofertório no rito novo?

No novo rito, o Ofertório foi suprimido e substituído por uma preparação das oferendas, cujo texto é tirado de uma oração judaica para a bênção da mesa:

“Sois bendito, Senhor, Deus do Universo, Vós, que nos dais este pão, fruto da terra e do trabalho do homem. Nós Vo-lo apresentamos; ele virará o pão da vida.”

O que se pode destacar nesta nova oração?

Além de sua tonalidade muito naturalista (nada nela alude às Verdades sobrenaturais reveladas por Deus), nota-se que essa oração esvazia totalmente as idéias de Sacrifício e de propiciação. É o equivalente a uma simples bênção antes de uma refeição.

O mais importante não é que o Cânon da Missa – o muito antigo e muito venerável Cânon romano – tenha sido conservado?

Não se pode, realmente, dizer que o Cânon romano tenha sido conservado pela nova Liturgia.

Primeiro, porque perdeu seu caráter de Cânon, isto é, de regra fixa e obrigatória: não é mais que uma possibilidade entre várias (virou a “oração eucarística nº 1”, à qual, de fato, prefere-se, freqüentemente, uma das outras três “orações eucarísticas” introduzidas, em 1969, ou mesmo uma das múltiplas outras autorizadas pela Santa Sé).
Em seguida, mesmo essa “oração eucarística nº 1” deforma o Cânon romano.

A “oração eucarística nº 1” da nova Liturgia não retoma o Cânon romano?

A “oração eucarística nº 1” da nova Liturgia pode parecer, à primeira vista, retomar o antigo Cânon romano. De fato, introduziu neste várias modificações. É preciso sublinhar dentre elas:

– A recitação em voz alta (que implica uma dessacralização do Cânon);
– A modificação da fórmula consecratória (aproximada do rito luterano);
– A banalização dessa fórmula consecratória (doravante pronunciada em tom narrativo, como um relato, e não em tom intimativo);
– A supressão da genuflexão do sacerdote entre a Consagração e a elevação (o que favorece a heresia segundo a qual seria a fé dos fiéis, e não as palavras consecratórias que causariam a Presença Real);
– A supressão de numerosos sinais-da-cruz;
– O acréscimo de uma aclamação ambígua depois da Consagração.

Todas essas novas maneiras de agir são, verdadeiramente, más?

Tomadas separadamente, todas essas práticas não são necessariamente más em si mesmas (pode-se mesmo encontrar uma ou outra entre estas em um ou outro rito oriental). Mas, tomadas em seu conjunto e comparadas com o que se fazia antes, todas vêm no sentido do enfraquecimento da Fé.

As outras três “orações eucarísticas” são também contestáveis?

As outras três “orações eucarísticas” acrescentam, às faltas da primeira, várias graves deficiências que o Pe. Calmel resume assim:

“Começa-se por transferir para depois da Consagração a maior parte das Preces Eucharisticae; só há uma breve invocação ao Espírito Santo encravada entre o Sanctus e o relato da instituição. Deseja-se, a toda força, que o sacerdote desemboque na Consagração, sem lhe deixar o tempo conveniente para tomar consciência do que vai fazer, sem lhe permitir que se prepare para o Mistério infinito que vai realizar. (…) Enfim, mesmo se foram guardadas – mal ou bem – certas idéias do Cânon romano sobre a natureza da Missa e sobre seus efeitos; estas, foram, sistematicamente, amolecidas e enfraquecidas por omissões bem calculadas: o Senhor Deus, a Quem o Sacrifício é oferecido, não é mais invocado com os títulos de Sua Onipotência ou de Sua Clemência infinita; – nenhuma só palavra sobre nossa condição de servos e de pecadores, obrigados por esses dois títulos a oferecer o Santo Sacrifício; – nada sobre a Igreja enquanto católica e apostólica (…)”.267

Essas críticas não são muito severas?

Essas críticas são verdadeiras. E podem-se passar em revista ainda muitas omissões comuns às três novas “orações eucarísticas”: a finalidade propiciatória do Sacrifício da Missa nunca é explicitamente afirmada (mesmo se as palavras sacrifício e vítima figurem na orações nº 3 e nº 4); todas as figuras do Sacrifício de Cristo (Abel, Abraão, Melquisedec) desapareceram; a Virgem Maria nunca é chamada de sempre Virgem; os méritos dos santos são ignorados (estes sendo reduzidos ao anonimato: mesmo São Pedro não é mencionado); o inferno é inteiramente silenciado, etc.

A “oração eucarística nº 2” não é muito antiga?

A “oração eucarística nº 2” merece, efetivamente, uma menção especial, pois pode, como se escreveu, “ser empregada, com toda tranqüilidade de consciência, por um sacerdote que não creia mais nem na transubstanciação, nem no caráter sacrifical da Missa: essa “oração eucarística” pode muito bem servir para a celebração de um ministro protestante”.268 A noção de Sacrifício, nela, não aparece nenhuma só vez. É, todavia, a mais empregada, porque se faz passar por antiga e venerável, e, sobretudo, porque é a mais curta das quatro (apelidaram-na de mini-canon).

Essa “oração eucarística nº2” não é o cânon de São Hipólito (século III)?

Pretende-se que essa oração seria o antigo cânon de Hipólito; mas:

Seria apenas uma forma mutilada desse cânon (a passagem afirmando que Cristo se entregou, voluntariamente, ao sofrimento “para destruir a morte, destruir a servidão ao demônio, pisotear o Inferno, esclarecer os justos” foi, por exemplo, suprimida);269
Esquece-se de dizer que Hipólito foi o segundo Anti-Papa e que não está comprovado de forma nenhuma que sua Liturgia tenha sido celebrada na Igreja Católica.

Esse Hipólito não era, entretanto, um santo?

O padre Roguet, que é insuspeito de hostilidade para com a nova Liturgia, explica:

“Hipólito não dá seu texto como um cânon; isto é, uma fórmula fixa e obrigatória; mas sim como um modelo para improvisação: seu texto não foi, sem dúvida, pronunciado tal qual é. Enfim, era um personagem muito reacionário, oposto à hierarquia romana ao ponto de se ter erigido em Anti-Papa (o que reparou pelo martírio) e é bem possível que tenha apresentado sua anáfora, contra a oração eucarística então empregada em Roma”.270

Quais são as conseqüências das deficiências dessas novas orações eucarísticas?

O padre Calmel explica:

“Por conseqüência dessas alterações e manipulações, as riquezas inesgotáveis; mas bem definidas, do rito consecratório não estão mais convenientemente explicitadas. As disposições interiores requeridas para receber os frutos sobreanturais do Santo Sacrifício não estão mais favorecidas como convém. Como evitar que sacerdotes e fiéis, pouco a pouco, cessem de perceber o significado da Missa, e, que a Missa católica caminhe em direção à Ceia protestante ?”271

Todas essas deficiências da Missa nova são fortuitas ou correspondem a um espírito de conjunto?

A nova Liturgia é portadora de um espírito próprio, que é um espírito novo. Seu autor principal, padre Annibal Bugnini, podia declarar:

“A imagem da Liturgia dada pelo Concílio é totalmente diferente do que ela era antes”.272

Como se pode resumir o espírito que inspirou a redação da Missa nova?

O espírito que inspirou a redação do novo rito da Missa está claramente visível na Introdução Geral do novo missal. Manifesta-se, sobretudo, no seu artigo 7º, que declara:

“A Ceia do Senhor ou Missa é uma sinaxe (reunião) sagrada; isto é, a reunião do Povo de Deus, sob a presidência do padre, para celebrar o memorial do Senhor. É por isso que a reunião da Igreja local realiza de modo eminente a promessa de Cristo: “Quando um ou dois estiverem reunidos em Meu nome, estarei lá no meio deles”.

O que se destaca nesse artigo 7º?

A descrição que esse artigo 7º faz da Missa não tem nada de especificamente católico, e poderia muito bem se aplicar à Ceia protestante. Se toma-se esse artigo como uma definição, deve mesmo ser considerado como herético.

Em que esse artigo 7º se opõe ao ensinamento da Igreja?

O artigo 7º se opõe ao ensinamento da Igreja sobre os três pontos essenciais que separam a Missa católica da Ceia protestante:

A Missa é essencialmente um sacrifício (propiciatório), não uma assembléia de fiéis reunidos para celebrar um “memorial”;
O sacerdote é essencialmente um instrumento (livre e voluntário) pelo qual Cristo renova Seu Sacrifício – e não um simples presidente de assembléia;
Nosso Senhor está presente na Eucaristia com Seu Corpo e Seu Sangue, e não somente de modo espiritual (como quando duas ou três pessoas estão reunidas em seu nome).

Pelo menos não é verdade que a Missa é uma reunião de fiéis?

A presença de fiéis não é necessária para a celebração da Santa Missa (embora seja desejável). A terceira oração eucarística favorece o erro sobre este ponto, afirmando: “Até o fim dos tempos Vós reunis o Vosso Povo, para que Vos ofereça em Vosso Nome uma oblação pura”.

Essa má apresentação da Missa é própria ao artigo 7º ou se encontra em toda a Introdução Geral do novo missal?

Essa má apresentação da Missa se encontra em toda a Introdução geral do missal de 1969, da qual o artigo 7º é perfeito resumo:

A palavra “sacrifício” figura algumas vezes, de modo vago, nos 341 artigos dessa introdução; mas nunca se fala de Sacrifício propiciatório (a Missa é apresentada mais como um banquete, um festim, );
O fato de o sacerdote ser –e somente ele – o instrumento pelo qual Nosso Senhor, na hora da Consagração, renova o Seu Sacrifício, também nunca é mencionado; 273

A expressão “Presença real” está igualmente ausente. Menciona-se a “presença” de Cristo na Eucaristia; mas da mesma maneira que se fala de Sua “presença” na Sagrada Escritura. – E, a expressão “transubstanciação”, que é a única que exprime sem nenhuma ambigüidade a Fé Católica, foi também omitida 274.

O simples fato de que a palavra “transubstanciação” não figure na Introdução Geral do missal de 1969 não é, entretanto, suficiente para concluir-se que seus autores não acreditavam nela?

Não se trata de julgar a fé pessoal dos autores do novo missal; mas de saber se, objetivamente, a Fé Católica está expressa no mesmo. Em 1794, Pio VI condenou uma proposição do Sínodo jansenista de Pistóia, que exprimia de modo exato a doutrina católica sobre a Eucaristia, unicamente pela razão de que omitia o emprego da palavra transubstanciação. Essa única omissão bastou a Pio VI, para declarar que essa proposição favorecia os hereges.275 Ora, a Introdução geral do missal de 1969 é muito menos clara, sobre este assunto, do que o Sínodo de Pistóia. E, ao mesmo tempo, este missal suprime muitos sinais de respeito para com a Santa Eucaristia. É evidentemente perigoso para a Fé.

A Introdução Geral do novo missal não foi depois corrigida?

A Introdução Geral do novo missal, e especialmente seu artigo 7º, suscitaram tal comoção, que foi modificada em 1970. Notadamente, acrescentaram-se (uma vez) as palavras “transubstanciação” e “propiciatório”, a fim de que não se pudesse mais dizer mas se omite em dizer que que estas não estivessem no documento.276 Mas o novo rito mesmo – cujo espírito o artigo 7º exprimia perfeitamente – não mudou !!! Continua a dar aos fiéis que nele participam a mesma idéia da Missa: uma assembléia do Povo de Deus, para celebrar um memorial, sob a presidência do padre. É quase a concepção protestante.

A protestantização do rito da Missa foi intencional?
O acadêmico Jean Guitton, grande amigo e confidente de Paulo VI, declarou que o Papa quis deliberadamente remover da Missa tudo o que pudesse desagradar aos protestantes. De fato, Paulo VI pediu a seis pastores protestantes para colaborarem na redação da Missa nova. Uma célebre fotografia mostra-o em companhia desses ministros protestantes. Um deles, Max Thurian, de Taizé, explicou mais tarde: “Nessa Missa renovada, nada há que possa realmente incomodar os protestantes evangélicos”277.Mais tarde, em 1988, ele foi ordenado padre, sem ter antes abjurado o protestantismo.

Quando Jean Guitton evocou essa vontade de Paulo VI?

Numa transmissão radiofônica, consagrada a Paulo VI, (em 19 de dezembro de 1993, na Radio-Courtoisie), Jean Guitton evocou, nestes termos, a intenção com que Paulo VI mandou realizar o novo rito:

“A Missa de Paulo VI, primeiramente, apresenta-se como um banquete, e insiste muito sobre o aspecto de participação em um banquete, e muito menos sobre a noção de Sacrifício ritual em face de Deus – com o sacerdote somente mostrando as costas. Então, creio não me enganar ao dizer que a intenção de Paulo VI, e da nova Liturgia, que leva seu nome, é a de pedir aos fiéis uma maior participação na Missa, a de dar maior espaço para a Escritura, um menor espaço a tudo que há…; alguns dirão, de mágico, outros, Consagração transubstancial, e que é a Fé Católica. Dito de outra forma, há, em Paulo VI, uma intenção ecumênica de apagar; ou, ao menos de corrigir; ou, ao menos de suavizar o que há de católico demais, no sentido tradicional, na Missa, e de aproximar a Missa – eu o repito – da Ceia calvinista.”

Há outros testemunhos da orientação ecumênica da nova Liturgia?

O principal autor da reforma litúrgica, o padre Annibal Bugnini (1912-1982), nunca escondeu suas intenções ecumênicas. Delas fez a confissão mais significativa, em 1965, em uma pequena frase surpreendente, que merece ser lida duas vezes:

“A Igreja foi guiada pelo amor às almas e pelo desejo de tudo fazer para facilitar a nossos irmãos separados o caminho da união, removendo toda pedra que poderia constituir qualquer sombra de risco de obstáculo ou de desprazer”278.

Releiamos: remover toda pedra, 1) que poderia constituir (no futuro do pretérito); 2) sombra; 3) de um risco; 4) de desprazer…

Como os protestantes avaliaram a Missa nova de Paulo VI?

Muitos protestantes – que, evidentemente, recusavam a Missa tradicional – afirmaram que não viam nenhuma dificuldade em utilizar o novo rito para celebrar sua Ceia protestante. Além de Max Thurian (em La Croix de 30 de maio de 1969); podem- se citar, entre outros, G. Siegvalt (Le Monde de 22 de novembro de 1969); Roger Mehl (Le Monde de 10 de setembro de 1970); Ottfried Jordahn (conferência de 15 de junho de 1975, a Maria Laach); enfim, a Declaração oficial do Consistório Superior da igreja da Confissão de Augsburgo da Alsácia-Lorena, de 08 de dezembro de 1973.

Os protestantes foram os únicos não-católicos a influenciar a preparação da Liturgia nova?

Além da influência protestante, a reforma litúrgica de 1969 sofreu a influência da Maçonaria.

Como se exerceu essa influência maçônica sobre a reforma litúrgica de 1969?

A influência da Maçonaria sobre a reforma litúrgica se exerceu, primeiramente, de modo indireto, graças à abertura ao mundo pregada por Vaticano II, no momento mesmo em que a sociedade civil se deixava dominar pelos slogans maçônicos: progresso, culto do homem, liberdade, secularização, tolerância, igualdade, etc. Tudo o que manifestava a transcendência divina, o senso do sagrado, o respeito pela autoridade, o desprezo do mundo, a confissão de nosso estado de pecadores, a importância do combate espiritual, a necessidade do sacrifício e da reparação, ou mesmo apenas o claro reconhecimento de uma ordem sobrenatural, tudo isso pareceu inadaptado ao “homem moderno”, e foi eliminado ou edulcorado.

Podeis dar exemplos dessas mudanças?

A nova Liturgia modificou ou expurgou textos que falavam claramente demais: a) do inferno ou do diabo (Dies irae na missa dos defuntos; coletas do XVIIº domingo depois de Pentecostes, de São Nicolau, São Camilo de Lelis, etc.); b) do pecado original (coleta de Cristo-Rei);c) da penitência (coletas de São Raimundo de Peñafort, de São João Maria Vianney cura d’Ars, da Quinta-Feira depois das Cinzas); d) do desprezo das coisas da terra (coleta de São Francisco de Assis, pós-comunhão do IIº domingo do Advento; secreta do IIIº domingo depois da Páscoa); e) da necessária satisfação pelos pecados ( Coleta da Festa do Sagrado Coração de Jesus); f) dos inimigos da Igreja (comunhão da Festa da Exaltação da Santa Cruz, coletas de São Pio V, São João Capistrano, etc.); g) dos perigos do erro (oração da Sexta-Feira Santa pela conversão dos hereges e cismáticos; coletas de São Pedro Canísio, São Roberto Bellarmino, Santo Agostinho de Cantorbéry); h) dos milagres dos santos (coletas de São Nicolau, São Francisco Xavier, São Raimundo de Peñafort, São João de Deus, Santa Francisca Romana, ). 279

Essas supressões eram, verdadeiramente, a expressão de um espírito novo?

Paulo VI declarou, nesse mesmo ano de 1969:

“A partir do Concílio, propagou-se, na Igreja, uma onda de serenidade e de otimismo, um Cristianismo estimulante e positivo, amigo da vida, dos valores terrestres (…). Uma intenção de tornar o Cristianismo aceitável e amável, indulgente e aberto, desprendido de qualquer rigorismo medieval, de toda interpretação pessimista dos homens, de seus costumes.”280

Houve também uma influência direta da Maçonaria sobre a reforma litúrgica de 1969?

Em 1975, o grande arquiteto da missa nova, Annibal Bugnini, foi denunciado a Paulo VI como maçom. O eclesiástico que o acusava fornecia provas e ameaçava tornar a coisa pública. Paulo VI levou a coisa muito a sério, e, para evitar escândalo, demitiu imediatamente Mons. Bugnini de suas funções de Secretário da Congregação para o Culto Divino, antes de nomeá-lo pró-núncio em Teerã (janeiro de 1976).281 Em 1976 e 1978, encontrou-se o nome de Annibal Bugnini nas listas de prelados maçons publicadas pela imprensa italiana.282

A promulgação de um rito não pertence à infalibilidade da Igreja?
Afirma-se, às vezes, que a promulgação de um novo rito ou a publicação de uma lei universal (por exemplo, uma lei litúrgica) estariam automaticamente no âmbito da infalibilidade da Igreja, de sorte que nada nestes se poderia encontrar de falso ou de prejudicial à Igreja. Mas não é verdade. É o mesmo com a Liturgia e com o ensinamento do Papa. Do mesmo modo que nem toda palavra do Papa é infalível; mas que a infalibilidade só lhe pertence em certas condições; igualmente, nem toda ordenança litúrgica é, em si mesma, infalível. Esta o será apenas se a autoridade eclesiástica promulgá-la com toda a sua autoridade e engajar a sua infalibilidade.

Já ocorreu, no passado, que a Santa Sé publicasse livros litúrgicos que podiam favorecer o erro?

Sim, já ocorreu (embora excepcionalmente) que a Santa Sé publicasse livros litúrgicos que podiam favorecer o erro.

Podeis dar um exemplo?
O Pontifical Romano conteve, por muito tempo, uma rubrica recomendando ao Bispo de bem velar, na hora da ordenação do sacerdote, para que este tocasse o cálice e a patena, pois seria através disso que o caráter sacerdotal seria impresso. Essa rubrica foi suprimida por Pio XII (Sacramentum ordinis 1947) precisando que somente a imposição das mãos é matéria essencial da ordenação sacerdotal.

Podeis dar outro exemplo?

O Pontifical Romano do século XIII continha um erro ainda mais surpreendente. Afirmava que a Consagração do vinho no Sangue de Cristo poderia ser realizada, mesmo sem as palavras da Consagração, tão só pelo contato do vinho com uma Hóstia consagrada.

Como se pode explicar a presença de tais erros nos livros litúrgicos aprovados pela Santa Sé?

Esses erros são possíveis porque a Santa Sé, ao aprovar as rubricas, não lhes entendia dar valor de definições dogmáticas. É óbvio para todo mundo. (Os teólogos discutiram até Pio XII sobre a matéria do Sacramento da Ordem; não consideravam essas rubricas suficientes para resolver a questão).

O que se pode concluir desses exemplos?

Esses exemplos mostram à evidência que a Santa Sé não engaja sempre sua infalibilidade em matéria litúrgica. Para saber em que medida a infalibilidade está engajada, é necessário considerar atentamente a natureza, o conteúdo essencial, as circunstâncias e o grau de autoridade das decisões tomadas.

Não é surpreendente que a Igreja não engaje sempre sua infalibilidade na Liturgia?

Os Concílios mesmos, e os documentos pontifícios, ficam longe de engajar a infalibilidade, em todas e cada uma de suas partes; mesmo quando têm por objetivo direto e primeiro ensinar a doutrina. É, pois, lógico que os ritos litúrgicos – que só a ensinam de modo indireto – também não a engajem sempre.

Se não engaja sempre a infalibilidade, pode-se, pois, criticar livremente a Liturgia estabelecida pela Igreja?

Embora não envolva sempre a infalibilidade (e que possa, então, excepcionalmente, conter erros), a Liturgia estabelecida pela Igreja deve ser venerada e respeitada. Seria temerário, escandaloso e ímpio pretender submetê-la, por princípio, ao nosso julgamento particular.283

A disciplina e a Liturgia estabelecidas pela Santa Sé devem, então, ser sempre aceitas; mesmo quando não engajam a infalibilidade?

Como regra geral, sim; a disciplina e a liturgia estabelecidas pela Santa Sé devem sempre ser integralmente aceitas (do mesmo modo que é preciso aderir ao todo de seu ensinamento, sem se limitar ao que é infalível). Em caso de crise excepcional, todavia, se há a evidência de que uma decisão que não engaja a infalibilidade é perigosa para a Fé; pode-se, e deve-se mesmo resistir-lhe.

É, então, possível que um Papa tente promulgar uma Liturgia perigosa para a Fé?

A situação presente indica – infelizmente, aliás – que não é impossível que um Papa, em tempo de crise excepcional, pretenda promulgar uma Liturgia que, sem ser propriamente herética, seja perigosa para a Fé. Uma tal catástrofe é facilitada pela mentalidade liberal dos Papas pós-conciliares, que repugnam, visivelmente, engajar sua infalibilidade. Por outro lado, é impossível que uma tal Liturgia seja aceita, pacificamente, por toda a Igreja (isso sim significaria que as “portas do Inferno teriam prevalecido”)284. De fato, o caráter nocivo da nova Liturgia foi solenemente denunciado, em Roma mesmo, por Cardeais (dentre os quais, o Cardeal Ottaviani, que havia sido Pró-Prefeito do Santo Ofício – e, pois, número dois do Vaticano –sob três Papas sucessivos). Em todo o orbe, Bispos, padres e fiéis recusaram, publicamente, celebrá-la ou de se lhe associar.

Pode-se estar certo de que a nova Liturgia de Paulo VI não engaja a infalibilidade pontifícia?

No que concerne à Missa nova, o Papa Paulo VI declarou que seus ritos podem receber diversas qualificações teológicas:

“O rito e a correspondente rubrica não são, em si mesmos, uma definição dogmática. Podem ter qualificações teológicas de valor diverso, segundo o contexto litúrgico ao qual se refiram. São gestos e palavras aplicados a uma ação religiosa vivida, vivendo de um Mistério inexprimível de presença divina, e que não é sempre realizada sob uma forma unívoca. Somente a crítica teológica pode analisar essa ação e exprimi-la em fórmulas doutrinais logicamente satisfatórias”.285

O que é necessário concluir?

A afirmação segundo a qual a Missa nova seria objeto da infalibilidade da Igreja é insustentável.

O que pensar da Missa versus populum?
A celebração de frente para o povo tem por objetivo apresentar a Missa como uma refeição (o altar, de frente para o povo, toma geralmente a forma de uma mesa). O sacerdote, neste caso, é aquele que preside a mesa, e vira-se, naturalmente, em direção ao povo. Mas, porque a Missa não é, essencialmente, uma refeição, esta prática deve ser rejeitada.

Ademais, a celebração versus populum dá a impressão de uma cerimônia puramente mundana, em que o homem está no centro. A oração se torna mais difícil, pois esse face a face humano não orienta em direção ao Senhor (ad Dominum).

A Missa versus populum não é um retorno aos usos da Igreja primitiva?

É, em realidade, muito duvidoso que a Missa tenha sido celebrada de frente para o povo na Antigüidade Cristã. Mas, mesmo se for o caso, um retorno a formas litúrgicas abandonadas desde muito tempo não seria boa coisa. Uma tal atitude se opõe à verdadeira Tradição (que se apega ao que foi transmitido [em latim: tradere] e não ao que foi removido). É o arqueologismo, que Pio XII denunciou na encíclica Mediator Dei, como uma “excessiva e mal-sã paixão pelas coisas antigas”.

Pio XII precisou sua condenação ao “arqueologismo”?

Pio XII explica:

“Por exemplo, seria sair do reto caminho querer dar ao altar sua primitiva forma de mesa (…) Quando se trata da Liturgia sagrada, quem quer que desejasse retornar aos antigos ritos e costumes, rejeitando as normas introduzidas sob a ação da Providência, em razão das circunstâncias, não estaria movido, evidentemente, por uma solicitude sábia e justa.” 286

É preciso acrescentar que as práticas litúrgicas da Antigüidade são apenas imperfeitamente conhecidas. Expõe-se, pretendendo-se a estas retornar, a muitos erros.

A disposição das Basílicas romanas não prova, de modo indubitável, que, na Antigüidade, a Missa era celebrada de frente para o povo?

É, ao contrário, muito verossímil que a celebração versus populum nunca tenha existido na Antigüidade. É verdade que algumas Basílicas dão a impressão de que o sacerdote celebrava virado para o povo. Na realidade, é para o Oriente que ele queria se virar, e não ao povo. Se a Basílica estava dirigida para o oeste, o sacerdote se virava para o leste durante o cânon, pois se via no sol que nascia um símbolo de Cristo ressuscitado. Tinha, então, o povo diante de si; mas este, igualmente, virava-se em direção ao leste e tinha, pois, o sacerdote detrás de si. Todos rezavam, virados juntos para o Senhor (ad Dominum).

Não houve então, na Antigüidade Cristã, celebração versum populum?

O que é seguro é o seguinte:

– Que não era a regra geral;
– Que se ocorreu, não era na intenção de colocar sacerdote e fiéis face a face. A idéia segundo a qual o celebrante deveria celebrar virado para os fiéis é uma idéia de origem luterana. Não se a encontra jamais

A Missa nova é válida?

A validade da Missa depende da validade da Consagração (transubstanciação do pão no Corpo de Cristo, e, do vinho no Seu Sangue).

A Missa nova é válida, se é celebrada por um sacerdote validamente ordenado, que emprega a matéria requerida (pão de trigo e vinho de vinha), pronunciando as palavras requeridas (as da Consagração) e tendo a intenção requerida. O sacerdote deve, com efeito, querer fazer o que fazem Cristo e a Igreja, quando da celebração da Missa (deve ser um instrumento consciente a Seu serviço). Se ele se colocar em contradição consciente com a intenção da Igreja (recusando-se, por exemplo, a celebrar um sacrifício, e querendo apenas fazer memória da Última Ceia), a Missa seria inválida. Ora, pelo fato mesmo de que o rito novo possa facilmente ser compreendido num sentido protestante, pode muito facilmente ser usado por sacerdotes que não teriam mais a intenção requerida para a celebração da Missa. A coisa não tem nada de improvável, quando se vê a imagem totalmente falsa da Igreja, do sacerdócio e da Missa, que foi comunicada a muitos dos futuros sacerdotes, nos novos seminários.

Além disso, o emprego de um pão diferente do pão de trigo; de um vinho diferente do vinho de vinha ou a omissão das palavras da Consagração tornariam também inválida a Missa.

O fato de que as palavras da Consagração tenham sido modificadas no novo missal não pode pôr em dúvida a validade da Missa nova?

Essa modificação da fórmula de Consagração – que a aproxima do culto luterano – é lamentável; mas não basta, em si, para pôr em dúvida a validade da Missa nova (o significado essencial das palavras da Consagração está conservado). Por outro lado, certas traduções colocam um problema particular.

Certas traduções da fórmula consecratória podem levar a duvidar da validade da Missa?

O problema vem do fato de que, em vários países, as palavras da Consagração do vinho foram mal traduzidas. O texto latino diz: “Meu Sangue, que é derramado por vós e por muitos. [pro multis]). O francês adota uma tradução ambígua (“por vós e pela multidão”). Mas muitos idiomas (notadamente o inglês) adotaram uma tradução francamente falsa: “Meu Sangue, que é derramado por vós e por todos” ( em inglês: for all). Ora, esta tradução modifica o sentido do texto. Não se acham as palavras “por todos”, nem nos relatos da instituição da Eucaristia na Sagrada Escritura, nem nas palavras consecratórias de nenhuma Liturgia tradicional.

Não é verdade que Jesus Cristo derramou Seu sangue por todos os homens?

É muito verdadeiro que Cristo derramou Seu Sangue por todos, e que, por isso, todos os homens têm a possibilidade de obter a salvação (a salvação é proposta a todos). Mas, na Missa, trata-se da Nova Aliança (“Este é o cálice do Meu Sangue, Novo e Eterno Testamento”), e a esta Aliança não pertencem todos os homens; mas somente muitos; a saber, aqueles que recebem a Salvação. Na Missa, não se trata do oferecimento da salvação; mas de sua efetiva obtenção.

Essa falsa tradução tem conseqüências ?

É óbvio que essa falsa tradução está ligada à teoria moderna da salvação universal (nenhum homem se perde). Essa má tradução, que é um erro de fato, favorece, pois, uma verdadeira heresia !!!

Essa falsa tradução torna a Missa inválida?

Não é certo que essa falsa tradução torne inválida a Consagração (já que o sacerdote pode compreender “por todos” em um sentido que não vá contra a Fé; a saber, o de que a salvação é proposta a todos). Mas, torna, ao menos, duvidosa essa validade (sobretudo se o sacerdote entende a fórmula no sentido herético: todos os homens estão salvos).

Não é dar muita importância a um pequeno erro de tradução?

Não se trata de um “pequeno erro de tradução”; mas de uma modificação voluntária, à qual os inovadores mesmos dão muita importância. Na Hungria, por exemplo, os missais tinham ainda, há alguns anos, a tradução “por muitos”. Depois da abertura das fronteiras, novos missais foram editados, nos quais se encontra, doravante, a fórmula “por todos”. Se os inovadores se apegam tanto a uma única palavra, é porque eles lhe outorgam muita importância.

Há outros sinais da importância que os inovadores outorgam à substituição da expressão “por muitos” pela expressão “por todos”?

Um sinal da importância que os inovadores outorgam a esta fórmula errônea é que, depois de terem tentado impô-la por meio de más traduções, chegaram mesmo a falsificar o texto latino. O texto latino da Missa nova compreendia, com efeito, ainda a fórmula “pro multis” (“por muitos”). Ora, esta fórmula foi substituída pela fórmula “pro omnibus” (“por todos”) no texto latino da encíclica Ecclesia de Eucharistia de João Paulo II, de 17 de abril de 2003, §2º; tal como fora difundido pela Sala de Imprensa da Santa Sé (e no site do Vaticano na internet).

Uma tal falsificação não gerou protestos?

Essa falsificação gerou tantos protestos que, finalmente, a versão oficial (a que está publicada em Acta Apostólica Sedis) foi corrigida, e traz a expressão “pro multis”.287 Mas, o episódio permanece muito significativo. Os partidários da salvação universal querem dobrar a Liturgia à sua heresia. Foram parcialmente bem-sucedidos nisso, com a Missa nova de 1969 (que suprimiu ou atenuou as menções ao Inferno), e prosseguem em seus esforços.

É permitido tomar parte na Missa nova?

Mesmo se a Missa nova é válida, desagrada a Deus, enquanto é ecumênica e protestantizante. Representa, ademais, um perigo para a Fé no Santo Sacrifício da Missa. Deve, então, ser rejeitada. Quem compreendeu a problemática da Missa nova não deve mais assistir-lhe, pois colocaria em perigo a sua Fé, voluntariamente, e, ao mesmo tempo, encorajaria os outros a fazer o mesmo, parecendo dar seu assentimento às reformas.

(Adendo meu: Discordo gravemente deste afirmação. Mesmo que desagrade a Deus, se o Sacerdote proferir as duas anáforas, ainda que não creia, para o povo é válida a Missa, para o padre é sacrilégio. E a prova é simples: se não fossem as celebrações da Missa Nova, milhões de Sacrários estaria vazios, e o inferno já teria vencido a Igreja, pois Jesus já não estaria mais em nosso meio. Deve-se, pois sim, ir à Missa, qualquer o rito, Pio V ou o Novo, com amor e fé, por Jesus, não pelo rito que se celebra. Claro, receber Jesus em estado de graça) Aarão!

Como uma Missa válida pode desagradar a Deus?

Mesmo a Missa sacrílega que um sacerdote apóstata celebrasse para se rir de Cristo poderia ser válida. É, todavia, evidente que ofenderia a Deus, e que não seria permitido tomar parte nela. Do mesmo jeito, a Missa de um sacerdote grego cismático (válida, e celebrada segundo um rito venerável) desagrada a Deus, enquanto que é celebrada em oposição a Roma e à única Igreja de Cristo.

Não se pode, entretanto, assistir à Missa nova quando é celebrada de modo digno e piedoso por um sacerdote católico de fé absolutamente correta?

Não é aqui o celebrante que está em questão; mas o rito que este emprega. É, infelizmente, um fato que o novo rito deu a muitos católicos uma falsa noção da Missa, mais próxima da Ceia protestante do que do Santo Sacrifício. A Missa nova é uma das fontes principais da atual crise de Fé. É imperativamente necessário se distanciar dela.

Pode-se assistir à Missa nova em certas circunstâncias?
É preciso aplicar à Missa nova regras análogas às que valem para a assistência a uma cerimônia não-católica. Pode-se lá estar presente por razões familiares ou profissionais; mas deve-se comportar-se passivamente, e, sobretudo, não se vai comungar.

O que se deve fazer, quando não é possível assistir todos os domingos à Missa tradicional?
Aquele que não tem a possibilidade de assistir à Missa tradicional está escusado da obrigação da Missa naquele domingo. O preceito da Missa dominical somente obriga, com efeito, à assistência de uma verdadeira Missa católica. Deve- se, todavia, nesse caso, esforçar-se para assistir à Missa tradicional, ao menos, em intervalos regulares. Ademais, mesmo se está-se dispensado da assistência da Missa (que é um Mandamento da Igreja), não se está do Mandamento de Deus (“Tu santificarás o Dia do Senhor”). È necessário então substituir, de uma maneira ou de outra, essa Missa que não se pôde ter: por exemplo, lendo seu texto no missal, unindo-se de intenção a uma Missa celebrada em outro lugar, durante o tempo da mesma, e praticando a Comunhão espiritual.

Como se deve receber a Santa Comunhão?
A Santa Comunhão deve ser recebida com respeito, pois contém Nosso Senhor Jesus Cristo com Seu Corpo, Seu sangue, Sua Alma humana e Sua Divindade. A melhor forma de exprimir esse respeito é receber a Santa Comunhão sobre a língua, da mão do sacerdote, e de joelhos.

Jesus Cristo afirmou que está realmente presente na Eucaristia?

Sim, Jesus cristo afirmou solenemente Sua Presença Real na Eucaristia:

“Minha Carne é verdadeiramente alimento e Meu Sangue é verdadeiramente bebida. Quem come a Minha Carne e bebe Meu Sangue permanece em Mim e Eu, nele.” (Jo 6, 55).

Nosso Senhor exprimiu essa Verdade em outras ocasiões?

Nosso Senhor muito claramente exprimiu o que é a Santa Eucaristia logo mesmo na Sua Instituição, quando celebrou a primeira Missa, no curso da Última Ceia:

“Jesus tomou o pão, deu graças, partiu-o, e deu-o a seus discípulos, dizendo: “Tomai e comei, isto é Meu Corpo”. Depois, tomou o cálice, deu graças, deu-o a seus discípulos, dizendo: “Bebei todos, pois isto é Meu Sangue da Aliança, que é derramado por muitos em remissão dos pecados” (Mt 26,26).

Quem negou a Presença Real de Cristo na Eucaristia?

Durante quinze séculos e, salvo algumas raríssimas exceções (o herege Béranger de Tours, no século XI, que terminou por abjurar seu erro), os cristãos creram unanimemente na Presença Real de Cristo na Santa Eucaristia. Tinham em grande honra esse Sacramento, considerando-o como o mais precioso presente do Senhor. Foi somente no século XVI que os líderes da revolta protestante conseguiram levar multidões a negar a Fé na Eucaristia.

A Comunhão na mão é uma maneira digna de comungar?
Tal como é hoje praticada, a Comunhão na mão não respeita a Nosso Senhor Jesus Cristo realmente presente na Hóstia. Contraria a Fé na Presença Real, e deve ser rejeitada. Nunca existiu, sob esta forma, na Igreja.

A distribuição da Comunhão na mão não é uma prática da Igreja primitiva?

A Santa Comunhão foi distribuída na mão, em certas partes da Igreja primitiva; mas de modo completamente diferente do de hoje. O comungante se inclinava para a receber; e , ao menos, em algumas regiões, devia ter a mão recoberta por um véu. O sacerdote depositava a Hóstia na mão direita, e o fiel A levava à boca, sem pegá-La com a outra mão.

Essas diferenças de detalhe são verdadeiramente importantes?

Essas diferenças manifestam um estado de espírito completamente diferente do que prevalece hoje. A maneira hoje difundida de tomar a Hóstia se assemelha a um gesto de apossamento e de dominação inteiramente inoportuno para com o Corpo de Cristo.

Essa diferença de espírito entre a prática da Igreja primitiva e a prática atual se manifesta de outro modo?

Essa diferença de espírito se manifesta na grandíssima atenção dada ás partículas. São Cirilo de Jerusalém exorta os fiéis a estarem atentos para que nenhuma delas caísse por terra:

“Toma cuidado para que nada caia por terra. O que tu farás cair, seria como a perda de um dos teus membros. Dize-me, pois: se alguém te desse ouro em pó, não o recolherias cuidadosamente a fim de que nada fosse perdido em tua desvantagem? Não deverias ser muito mais atento para que nenhuma migalha se perca daquilo que é bem mais precioso do que o ouro ou do que o diamante ?”288

O que manifesta essa exortação de São Cirilo?

Aqui tudo inspira o respeito! Onde se escutam hoje tais advertências? Com a Comunhão na mão, numerosas parcelas caem por terra, sem que ninguém se atente. É uma falta de respeito objetivo para com Cristo.

Se, todavia, a Comunhão na mão já foi praticada na Igreja, como se pode recusá-la hoje?

Esse argumento reproduz um dos sofismas máximos da Revolução Litúrgica: o sofisma do arqueologismo, já denunciado e condenado por Pio XII.289

Em que esse argumento é um sofisma?

Esse argumento supõe que aquilo que era bom na Antigüidade cristã seja necessariamente o melhor para hoje, e deva ser preferido a tudo que a Igreja instituiu no curso dos séculos. É evidentemente falso. O que era, originalmente, sem perigo, graças ao fervor primitivo, e porque não houvera ainda heresia contra a Presença Real, pode ser perigoso, desde que os protestantes negam a Transubstanciação. Ademais, o amor é inventivo, e o desenvolvimento progressivo é a lei da vida das criaturas. É, então, normal que a Igreja tenha desenvolvido bastante, com o tempo, a expressão da Fé e de Seu respeito para com o Santíssimo Sacramento. Querer retornar às práticas (materiais) da Igreja primitiva é, na realidade, trair o Seu espírito, pois é recusar todo o desenvolvimento que trazia em gérmen e ao qual Ela mesma deu impulso.

Não se pode dizer que recusar hoje a Comunhão na mão é também recusar o impulso e o desenvolvimento progressivo de que é portadora a Igreja?

Uma mudança somente pode ser qualificada de “progresso” de acordo com critérios de avaliação (A proliferação anárquica das células em um organismo vivo caracteriza bem um certo progresso; mas o do câncer, não o da vida). Ora, trata-se aqui de manifestar a Fé e o respeito para com Nosso Senhor. É, pois, evidente que a Comunhão na mão não constitui um progresso; mas uma regressão. Ademais, essa prática foi introduzida de modo revolucionário e subversivo no seio da Igreja.

Por que dizeis que a Comunhão na mão foi introduzida na Igreja de modo revolucionário e subversivo?

A Comunhão na mão foi, primeiramente, praticada sem autorização, contra as regras explícitas da Santa Igreja, por alguns grupos muito progressistas. Em 29 de maio de 1969, a instrução Memoriale Domini indicava essas desobediências, e lembrava, em detalhes, todas as vantagens da Comunhão na boca.290 Assinalava que uma enquete feita junto aos Bispos de rito latino manifestava que a grande maioria deles era contra a introdução da Comunhão na mão.291 Concluía que o uso tradicional devia ser mantido e exortava vivamente os Bispos, os padres e os fiéis a respeitá-lo com atenção.

Como a Comunhão na mão se difundiu depois ter sido assim condenada?

A Comunhão na mão se difundiu porque esse texto (redigido em nome de Paulo VI pelo Cardeal Gut e pelo inevitável Annibal Bugnini) era liberal. Depois de ter exposto todas as razões da necessidade da manutenção do costume tradicional, e ter afirmado que o Papa queria essa manutenção, terminava permitindo fazer o contrário !!! Agora que a questão parecia regulada por tudo o que precedia, o texto acrescentava, com efeito, que, lá onde já havia o hábito de comungar na mão (quer dizer, lá onde já se havia desobedecido !!!), as Conferências Episcopais podiam, se os fiéis o pedissem, e, com certas condições, autorizar essa nova prática.

Quais foram as conseqüências dessa instrução Memoriale Domini ?

A instrução Memoriale Domini autorizava, de fato, a Comunhão na mão, ao parecer proibi-la. Na Europa ocidental, e na América do Norte, as conseqüências foram imediatas: a nova prática, que o Papa afirmava somente autorizar com reservas, como uma tolerância, e por causa do pedido instante dos fiéis, foi, por quase toda parte, imposta em nome da obediência ao Papa a fiéis que nunca a haviam pedido.

Quais são as conseqüências da Comunhão na mão?
Além de favorecer os sacrilégios, a Comunhão na mão (e em pé) é, no mínimo, co-responsável pela perda, por muitos fiéis, da Fé na Presença Real de Cristo no Sacramento da Eucaristia. Aquele que, seriamente, crer receber o Homem-Deus na Santa Comunhão não pode se aproximar deste Sacramento sem manifestar seu respeito. A Comunhão na mão conduziu, pois, primeiramente, à tibieza e à indiferença; depois, à perda da Fé.

Pode-se, verdadeiramente, atribuir à Comunhão na mão a perda atual da Fé na Presença Real de Nosso Senhor?

A Comunhão na mão, sem dúvida, não é a causa única. Os erros e as lacunas da catequese e da pregação têm certamente sua parcela de responsabilidade, já que se apresentou, freqüentemente, a Presença Real como uma simples presença simbólica, negando a conversão real do pão no Corpo de Cristo. Mas a Comunhão na mão preparou os fiéis a aceitar esses falsos ensinamentos, pois se a Hóstia é só um símbolo de Cristo, nada há de surpreendente em receber a Comunhão sem um sinal particular de respeito.

É preciso celebrar a Missa em latim?
Do mesmo jeito que não se usa a roupa do dia-a-dia para uma cerimônia importante, é grandemente conveniente que o idioma da Santa Liturgia não seja o da rua. A língua vulgar não combina com a ação sagrada. No Ocidente, o latim foi, durante séculos, a língua da Liturgia. Mas, em outras partes da Igreja, e mesmo em numerosas religiões não-cristãs, há também uma língua sagrada.

Os não-católicos utilizam também uma língua sagrada?

A fixação da língua litúrgica, enquanto a língua corrente evolui, parece uma constante da humanidade. Os cismáticos gregos empregam na sua Liturgia o grego antigo; os russos utilizam o eslavônio. No tempo de Cristo, os judeus utilizavam já para a Liturgia o hebreu antigo, que não era mais a língua corrente (e nem Jesus, nem os Apóstolos criticaram essa maneira de agir). Encontra-se a mesma coisa no islã (o árabe literário, língua de oração, não é mais entendido pelas multidões) e em certas religiões orientais. Os pagãos romanos tinham, também, no seu culto, fórmulas arcaicas tornadas incompreensíveis.

Como se pode explicar esse uso universal de uma língua sagrada no culto divino?

O homem tem senso do sagrado naturalmente. Compreende instintivamente que o culto divino não depende de si; que deve respeitá-lo e transmiti-lo tal como o recebeu, sem se permitir subvertê-lo. O emprego de uma língua fixa e sagrada, na religião, está conforme à psicologia humana, assim como à natureza imutável das realidades divinas.

Os fiéis não compreendem melhor a Missa celebrada em seu idioma pátrio?
A Missa realiza Mistérios inefáveis que nenhum homem pode compreender perfeitamente. Esse caráter misterioso encontra sua expressão no emprego de uma língua misteriosa, que não é imediatamente compreendida por todos. (É também por isso que algumas partes da Missa são ditas em voz baixa).

A língua vernacular, ao contrário, dá a impressão superficial de uma compreensão que, na realidade, não existe. As pessoas imaginam compreender a Missa, porque é celebrada na sua língua materna. De fato, não sabem, geralmente, nada sobre a essência do Santo Sacrifício.

A função do latim é, pois, a de colocar uma barreira entre os fiéis e os Santos Mistérios?

Não se trata de edificar um muro opaco que mascararia tudo; mas, ao contrário, de fazer apreciar melhor as perspectivas. É preciso, para isso, manter uma certa distância. Para penetrar um pouco no Mistério da Missa, a primeira condição é reconhecer humildemente que se trata, efetivamente, de um Mistério; de algo que nos supera.

Se o caráter misterioso do latim é tão benéfico, é necessário dissuadir os fiéis de aprendê-lo, e lamentar por aqueles que o compreendem?

O emprego do latim na Liturgia conserva o senso do Mistério mesmo para aqueles que conhecem esta língua. Somente o fato de que se trate de uma língua especial, distinta da língua materna e da língua da rua (uma língua que, de si, não é imediatamente compreendida por todos, embora, de fato, alguém a compreenda) basta para causar um certo recuo, que favorece o respeito. O estudo do latim cristão deve, pois, ser vivamente encorajado. O esforço que demanda contribuirá a elevar em direção ao Mistério – enquanto que a Liturgia em língua vulgar tende a rebaixá-lo ao nível humano.

O emprego do latim não arrisca, entretanto, de deixar certos fiéis na ignorância da Liturgia?

O Concílio de Trento tornou para o sacerdote uma obrigação pregar, com freqüência, sobre a Missa e explicar seus ritos aos fiéis. Os fiéis têm, ainda por cima, missais em que as orações latinas estão traduzidas. Podem, pois, ter acesso às belas orações da Liturgia, sem que as vantagens do latim sejam perdidas. A experiência prova, ademais, que, nos nossos países latinos, a compreensão do latim litúrgico (senão em todos os seus detalhes, ao menos de modo global) é, relativamente, fácil para quem se interessa em aprender.292 O esforço de atenção requerido favorecerá a verdadeira participação dos fiéis na Liturgia: aquela da inteligência e da vontade. Enquanto que a língua vernacular arrisca, ao contrário, encorajar à preguiça.

O emprego de uma língua sagrada na Liturgia não introduz um corte arbitrário entre a vida de todos os dias (“profana”) e a vida espiritual, enquanto que o papel do cristão deveria ser, ao contrário, de tudo consagrar a Deus (inclusive sua língua quotidiana)?

Para viver o espírito de oração em todas as suas atividades, é necessário saber, por alguns instantes, abandonar essas mesmas atividades, para se consagrar apenas à oração. Aqui é a mesma coisa: utilizar, por alguns instantes, uma língua sagrada para melhor tomar consciência da transcendência de Deus será uma ajuda, e não um impedimento, à oração de cada instante.

Que razões militam ainda em favor do emprego do latim?
Três outras razões em favor do emprego do latim são:
– Sua imutabilidade (ou, ao menos, sua grande estabilidade);
– Seu emprego quase bimilenar na Liturgia;
– O fato de que simboliza e favorece a unidade da Igreja.

Em que a imutabilidade do latim é uma vantagem?

A Fé imutável requer, como instrumento proporcionado, uma língua que seja a mais imutável possível, e assim possa servir de referência. Ora, o latim, que não é mais uma língua corrente, não muda mais (ou quase não muda mais). Em uma língua corrente, ao contrário, as palavras podem sofrer mudanças de significado ou de registro muito rapidamente (podem tomar uma conotação pejorativa ou ridícula que não possuíam antes). O uso de uma língua assim pode então, facilmente, levar a erros ou a ambigüidades, enquanto que o uso do latim preserva, de uma só vez, tanto a dignidade quanto a ortodoxia da Liturgia.293

Em que o uso quase bimilenar da língua latina na Liturgia é uma vantagem?

Empregada na Liturgia durante quase dois mil anos, a língua latina foi como que santificada. É reconfortante poder rezar com as mesmas palavras que nossos antepassados e que todos os sacerdotes e monges desde séculos. Sentimos, de modo concreto, a continuidade da Igreja através dos tempos, e unimos nossa oração à Dela. O tempo e a eternidade se reúnem.

Como o latim simboliza a unidade da Igreja?

O latim não manifesta apenas a unidade da Igreja através do tempo; mas também no espaço294. Favorecendo a união com Roma (preservou a Polônia do cisma eslavo), une também entre si todas as nações cristãs. Antes do Concílio, a Missa de rito romano era, por toda parte, celebrada na mesma língua. Os fiéis encontravam nos cinco continentes a Missa de sua própria paróquia. Hoje, essa imagem de unidade está estilhaçada. Não há mais nenhuma unidade na Liturgia: nem na língua, nem nos ritos. Ao ponto de que aquele que assiste a uma Missa celebrada numa língua que não conhece tenha muita dificuldade até mesmo em acompanhar as partes principais.

Como se pode resumir a utilidade do latim?

Nossa Igreja é Una, Santa, Católica e Apostólica. A língua latina contribui, a seu modo, para cada uma dessas características.295 Por seu gênio próprio (língua imperial), seu caráter hierático (língua “morta”), e, sobretudo, a consagração que recebeu, junto com o hebraico e o grego, sobre o titulum da Cruz296, serve, excelentemente, à santidade da Liturgia. Pelo seu uso universal e supranacional (não é mais a língua de nenhum país), manifesta a catolicidade da Igreja. Por sua ligação com a Roma de São Pedro, e com tantos Padres e Doutores da Igreja, que foram, por sua vez, o eco dos Apóstolos e os artesãos do latim litúrgico (forjaram não apenas suas orações, hinos e respostas; mas o próprio latim cristão, que é, por muitos traços, uma completa renovação do latim clássico), é o garante de Sua apostolicidade. Por seu emprego oficial, enfim, que lhe faz a língua de referência tanto do Magistério, quanto da Liturgia e do Direito Canônico, concorre, eficazmente, para a tripla unidade da Igreja: unidade de Fé, unidade de governo e unidade de culto.

REFERÊNCIAS

[234] Traduzido do francês “re-présentation”. [nota da tradução brasileira].

[240] DS 1743. Ver também DS 1741.

[241] Santo Agostinho, citado por Santo Tomás de Aquino em III, a.83, q.1.

[242] Texto atribuído a Santo Ambrósio, citado por Santo Tomás de Aquino em III, a.83, q.1 ad.1. “Sicut enim quod ubique offertur unum est corpus et non multa; ita et unum sacrificium”.

[243] Hb 6,20.

[244] 1Cor 11, 24.

245 Mt 26,28.

[246] Didaché, capítulo 14;RJ 8. Esse sacrifício é claramente designado como sendo o anunciado por Malaquias.

[247] São Clemente de Roma, primeira carta aos Coríntios, capítulo 14; RJ 19.

[248] São Gregório Nazianzeno, carta nº 171, ad Amphilochium; RJ 1019.

[249] Lutero, em Contra Henricum regem Angliae (1522) (t. X, p.220).

[250] Lutero, em De votis monasticis judicium (1521) (t. VIII, p.651).

[251] Lutero, Sermão do Primeiro Domingo do Advento (t. XI, p.774).

[252] Confissão de Augsburgo de Melanchton (1530; confissão de fé, quase oficial dos luteranos), art.24: Da Missa.

[253] Lutero,De captivitate Babylonica (1520) (t. VI, p.521).

[254] Lutero, t. XII, p.212.

[255] Ver a obra La Réforme liturgique anglicane de Michael Davies (Étampes, Clovis, 2004). O primeiro Prayer Book (1549) suprime o ofertório, modifica o Cânon e adota a versão luterana do relato da Instituição: o sacrifício propiciatório é silenciado; mas não é negado explicitamente. Foi apenas uma primeira etapa: desde que foi adotado por toda parte, um segundo Prayer Book foi publicado (1552) que se aproximava muito mais da Ceia calvinista.

[256] Lutero, citado por Jacques Maritain, Trois Réformateurs, Paris, 1925, p.247.

[257] Oeuvres Du B. Alphonse de Liguori, Avignon, Seguin, 1827, p.182.

[258] Dom Prosper Guéranger, Explication de La Sainte Messe, Paris, 1906, p.107.

[259] Dn 8, 2.

[260] “Cristo entrou uma vez por todas no Santuário, não com sangue de carneiros ou novilhos; mas com Seu próprio Sangue, tendo-nos adquirido uma Redenção eterna” (Hb 9, 12)

[261] Pio XII, Encíclica Mediator Dei, 20 de novembro de 1947.

[262] DS 1758.

[263] Lehmann Schlink, Des Opfer Jesu Christi und seine Gegenwart in der Kirche, Herder, 1983, p.223.

[264] Cardeal Alphonse Stickler, em Latin Mass Magazine, 05.05.1995.

[265] Cardeais Ottaviani e Bacci, Carta entregue a Paulo VI, em 29 de setembro de 1969, acompanhada de um Breve exame Crítico do novo Ordo missae, redigido por um grupo de teólogos.

[266] Lutero, em formula missae et comunionis (1523) (t.XII, p.211).

[267] Pe. Roger-Thomas Calmel, O.P. “Apologie pour le canon romain”, Itinéraires nº 157 (novembro de 1971), p.38. Pe. Calmel desenvolve, abundantemente, no resto do artigo, os fatos enumerados aqui.

[268] Breve Exame Crítico do novo Ordo missae, apresentado a Paulo VI, em 1969, pelos Cardeais Ottaviani e Bacci, cap. VI.

[269] Ver Hipólito de Roma, A Tradição Apostólica, texto latino, introdução, tradução e notas de Dom Bötte OSB, Paris, Cerf, “Sources Chrétiennes”, 1946, p.32.

[270] Aimon-Marie Roguet O.P, Pourquai le canon de la messe en français?, Paris, Cerf, 1967, p.23.

[271] Roger-Thomas Calmel O.P., “Apologie pour Le Canon romain”, Itinéraires nº 157 (novembro de 1971), p.38.

[272] Annibal Bugnini, DC nº 1491 (1967), col. 824.

[273] Pio XII ensina muito claramente: “A imolação incruenta, por meio da qual, depois das palavras da Consagração, Cristo se torna presente, sobre o altar, em estado de vítima, é levada a cabo somente pelo sacerdote, enquanto representa a pessoa de Cristo; não enquanto representa a pessoa dos fiéis” (Mediator Dei) – Ora, a Introdução Geral afirma que o sacerdote, na Missa, exprime-se seja em nome dos fiéis, seja em seu próprio nome (art 13); mas se omite em dizer que, no momento essencial, na Consagração, é representante só de Cristo.

[274] Alguns protestantes admitem, no limite, a expressão “presença real”; mas não “transubstanciação”, que designa, de modo muito preciso, a mudança de toda a substância do pão na substância do Corpo glorioso de Nosso Senhor – só restando as aparências exteriores.

[275] DS 2629.

[276] Essa adição das palavras “transubstanciação” e “propiciatório” foi feita na edição típica (isto é, oficial) do novo missal, promulgada em 26 de março de 1970, pela Congregação do Culto Divino.

[277] Max Thurian em La Croix de 30 de maio de 1969.

[278] Annibal Bugnini, DC nº 1445(1965), col.604. Annibal Bugnini comentando as modificações trazidas à Liturgia da Sexta-Feira Santa.

279] Resumimos aqui o estudo de Dom Edouard Guillou O.S.B “Les oraisons de La nouvelle messe et l’esprit de La reforme liturgique”. Encontra-se, neste, o texto completo dessas orações e exemplos complementares (estudo publicado em Fideliter nº 86, março-abril de 1992, p.58ss.).

[280] Paulo VI, DC nº 1538 (1969), col.1372.

[281] Ver, entre outros, as memórias de Mons. Bugnini (The Reform of the Liturgy, 1948- 1975,p.91) e a pesquisa de Michäel Davies (Liturgical Revolution, Pope Paul’s New Mass, Augustine Publishing Company, Devom, 1981, part 3, p.505).

[282] Listas publicadas em Panorama nº538 (10.08.76), depois em L’Osservatore Politico de Mino Pecorelli (12.09.1978). Notemos que o jornalista Mino Pecorelli era , ele mesmo, maçom. Foi assassinado a tiros alguns meses mais tarde (20 de março de 1979). Sobre esse caso, ver a pesquisa do professor Carlo-Alberto Agnoli, La Maçonnerie à La conquête de l’Eglise, Versailles, Publications Du Courrier de Rome, 2001.

[283] O Papa Pio VI, em sua Bula Auctorem fidei, assim condenou o sínodo jansenista de Pistóia (1786), que havia declarado que, na disciplina estabelecida e aprovada pela Igreja, era necessário fazer uma triagem, distinguindo o que era necessário ou útil do que era inútil, pesado, perigoso ou nocivo. Pio VI declarou que essa proposição era “falsa, temerária, escandalosa” (DS 2678).

[284] Pio VI, na Constituição Auctorem fidei, 28.08.1794, condenou os jansenistas que se exprimiam “como se a Igreja, que é regida pelo Espírito Santo, pudesse estabelecer uma disciplina (…) perigosa, nociva (…)” (DS 2678). Esse texto, que não tem nem a autoridade, nem a precisão de uma definição dogmática, mostra bem que as autoridades eclesiásticas gozam de uma certa infalibilidade em matéria disciplinar e litúrgica; mas não indica as condições, nem os limites exatos desta infalibilidade. Esperando que a Igreja resolva, os teólogos estão reduzidos, nesta questão, às hipóteses.

[285] Paulo VI, Audiência Geral de 19 de novembro de 1969; DC nº 1552 (1969), p.1056.

[286] Pio XII, encíclica Mediator Dei.

[287] Acta Apostolica Sedis, 07 de julho de 2003, p.434. – Sobre este episódio, ver Le Sel de La terre nº48, p.211. (nota dos editores franceses).

[288] São Cirilo de Jerusalém, quinta catequese mistagógica, 21; PG 33, 1126.

[289] Ver a pergunta nº 63 deste catecismo.

[290] DC nº1544 (1969), p.669-671; ver sobre este assunto Itinéraires nº 163 (maio de 1972).

[291] Em 2115 respostas válidas, 1233 Bispos se opunham categoricamente à introdução da Comunhão na mão, enquanto que somente 567 aprovavam-na sem reservas.

[292] Ver, em Le Sel de La terre nº44, p.219-234 e p.252-255, o exemplo do padre Emmanuel, na sua paróquia camponesa de Mesnil-Saint-Loup. (nota dos editores franceses).

[293] “O emprego da língua latina (…) é uma proteção eficaz contra toda corrupção de doutrina” (Pio XII, Mediator Dei) – “A dogmas imutáveis, é necessária uma língua imutável que proteja de qualquer alteração a própria formulação desses dogmas (…) Os protestantes e todos os inimigos da Igreja Católica sempre lhe reprovaram duramente o latim. Sentem que a imobilidade desta couraça defende, maravilhosamente, de toda alteração, essas antigas tradições cristãs, cujo testemunho os esmaga. Desejariam estilhaçar a forma, para atingir o fundo. O erro fala, com prazer, uma língua variável e cambiante” (Mons. De Ségur)

[294] “O emprego da língua latina, em uso em uma grande parte da Igreja, é um sinal de unidade manifesto e evidente (…)” (Pio XII, Mediator Dei).

[295] “Com efeito, já que agrupa, em Seu seio, todas as nações; já que está destinada a existir até a consumação dos séculos, e já que exclui, totalmente, de Seu governo os simples fiéis, a Igreja, por sua própria natureza, tem necessidade de uma língua universal, definitivamente fixada, que não seja uma língua vulgar” (Pio XI, Carta Apostólica Officiorum omnium, 01.08.1922 – Actes de Pie XI (anos 1922-23), Paris, Bonne Presse, p.87-88).

[296] “Jesus Nazareno Rei dos Judeus (…); a inscrição estava em hebraico, em grego e em latim” (Jo 19,20).

FONTE

O texto foi extraído da obra “Catecismo Católico da crise na Igreja”, cujo autor é o Padre Matthias Gaudron.

https://estudeteologia.com.br/um-padre-explica-as-razoes-teologicas-para-se-defender-a-missa-tridentina/


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