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18/04/2014
Depois da morte


Revelações - Depois da morte
18/4/2014 10:30:57

Revelações - Depois da morte


 16. A descida de Jesus aos infernos

Quando Jesus, com um grito forte, rendeu a santíssima alma, vi-a, qual figura luminosa, acompanhada de muitos Anjos, entre os quais também Gabriel, descer pela terra a dentro, ao pé da cruz. Vi, porém, que a divindade lhe ficou unida tanto à alma, como também ao corpo, pregado à cruz. Não sei explicar o modo porque se passou. Vi o lugar aonde se dirigiu a alma de Jesus; era dividido em três partes, parecendo três mundos e eu tinha a sensação de que tinha a forma redonda e que cada um estava separado do outro por uma esfera.
Antes de chegar ao limbo, havia um lugar claro e, por assim dizer, mais verdejante e alegre. Era o lugar em que vejo sempre entrarem as almas remidas do purgatório, antes de serem levadas ao céu. O limbo, onde se achavam os que esperavam a redenção, estava cercado de uma esfera cinzenta, nebulosa e dividido em vários círculos. Nosso Salvador, conduzido pelos Anjos como em triunfo, entrou por entre dois desses círculos, dos quais o esquerdo encerrava os Patriarcas até Abraão e o direito as almas de Abraão até João Batista. Jesus penetrou por entre os dois; eles, porém, ainda não O conheciam, mas estavam todos cheios de alegria e desejo; foi como se dilatassem esses páramos da saudade angustiosa, como se ali entrassem o ar, a luz e o orvalho da Redenção. Tudo se deu rapidamente, como o sopro do vento. Jesus penetrou através dos dois círculos, até um lugar cercado de neblina, onde se achavam Adão e Eva, nossos primeiros pais. Falou-lhes e adoraram-nO com indizível felicidade. O cortejo do Senhor, ao qual se juntou o primeiro casal humano, dirigiu-se então à esquerda, ao limbo dos Patriarcas que tinham vivido antes de Abraão. Era uma espécie de purgatório; pois entre eles se moviam, cá e lá, maus espíritos, que atormentavam e inquietavam algumas dessas almas de muitas maneiras. Os Anjos bateram e mandaram que abrissem; pois havia lá uma entrada, uma espécie de porta, que estava fechada; os Anjos anunciaram a vinda do Senhor, parecia-me ouví-los exclamar: “Abri as portas!” Jesus entrou triunfalmente; os espíritos maus, retirando-se, gritaram: “Que tens conosco? Que queres fazer de nós? Queres crucificar-nos também?, etc.” - Os Anjos, porém, amarraram-nos e empurraram-nos para diante. Essas almas sabiam pouco de Jesus, tinham só uma idéia obscura do Salvador; Jesus anunciou-lhes a Redenção e eles lhe cantaram louvores. Dirigiu-se então a alma do Senhor ao espaço à direita, ao verdadeiro limbo, em frente ao qual se encontrou com a alma do bom ladrão, conduzida por Anjos ao seio de Abraão e com a do mau ladrão que, cercado de espíritos maus, foi precipitada no inferno. A alma de Jesus dirigiu-lhes algumas palavras e entrou então no seio de Abraão, acompanhada dos Anjos, das almas remidas e dos demônios expulsos.
Esse lugar parecia-me situado um pouco mais alto; era como se se subisse do subterrâneo de uma igreja à igreja superior. Os demônios amarrados quiseram resistir, não queriam passar; mas foram levados à força pelos Anjos. Neste lugar estavam todos os santos Israelitas, à esquerda os Patriarcas, Moisés, os Juízes, os Reis; à direita os profetas e todos os antepassados e parentes de Jesus, até Joaquim, Ana, José, Zacarias, Isabel e João. Nesse lugar não havia nenhum mau espírito, nem tormento algum, a não ser o desejo ansioso da Redenção, que se realizara enfim. I
ndizível delícia e felicidade enchia as almas todas, que saudavam e adoravam o Salvador; os demônios amarrados foram obrigados a confessar sua ignomínia diante delas. Muitas dessas almas foram enviadas à terra, para entrar nos respectivos corpos e dar testemunho do Senhor. Foi nesse momento que tantos mortos saíram dos sepulcros em Jerusalém; apareciam como cadáveres ambulantes, depositando depois novamente os corpos, como um mensageiro da justiça deposita o manto oficial, depois de ter cumprido as ordens do superior.
Vi depois o cortejo triunfal do Salvador entrar numa esfera mais baixa, uma espécie de lugar de purificação, onde se achavam piedosos pagãos que tinham tido um pressentimento da verdade e o desejo de conhecê-la. Havia entre eles espíritos maus, porque tinham ídolos; vi os espíritos malignos forçados a confessar o embuste e as almas adorarem o Senhor com alegria tocante. Os demônios desse lugar foram também amarrados e levados no cortejo. Assim vi o Salvador passar triunfalmente, com grande velocidade, por vários lugares onde estavam almas encerradas, libertando-as e fazendo ainda muitas outras coisas, mas no meu estado de miséria não posso contar tudo.
Por fim o vi aproximar-se, com ar severo, do centro do abismo, do inferno, que me apareceu sob a forma de um imenso edifício horrível, formado de negros rochedos, de brilho metálico, cuja entrada tinha enormes portas, terríveis, pretas, fechadas com fechaduras e ferrolhos que causavam medo. Ouviam-se uivos de desespero e gritos de tormento, abriram-se as portas e apareceu um mundo hediondo e tenebroso.
Assim como vi as moradas dos bem-aventurados sob a forma de uma cidade, a Jerusalém celeste, com muitos palácios e jardins, cheios de frutas e flores maravilhosas, de várias espécies, conforme as inúmeras condições e graus de santidade, assim vi também o inferno como um mundo separado, com muitos edifícios, moradas e campos. Mas tudo destinado, ao contrário, à tortura e às penas dos condenados. Como na morada dos bem-aventurados tudo é disposto segundo as causas e condições da eterna paz, harmonia e alegria, assim no inferno se manifesta em tudo a eterna ira, discórdia e desespero. Como no céu há muitíssimos edifícios, indizivelmente belos, transparentes, destinados à alegria e à adoração, assim há no inferno inúmeros e variados cárceres e cavernas, cheios de tortura, maldição e desespero. No céu há maravilhosos jardins, cheios de frutos de gozo divino; no inferno horrendos desertos e pântanos, cheios de tormentos e angústias e de tudo que pode causar horror, medo e nojo. Vi templos, altares, castelos, tronos, jardins, lagos, rios de maldição, de ódio, de horror, de desespero, de confusão, de pena e tortura; como há no céu rios de bênção, de amor, de concórdia, de alegria e felicidade; aqui a eterna, terrível discórdia dos condenados; lá a união bem-aventurada dos santos. Todas as raízes da corrupção e do erro produzem aqui tortura e suplício, em inumeráveis manifestações e operações; há só um pensamento reto: a idéia austera da justiça divina, segundo a qual cada condenado sofre a pena, o suplício, que é o fruto necessário de seu crime; pois tudo que se passa e se vê de horrível nesse lugar, é a essência, a forma e a perversidade do pecado desmascarado, da serpente que atormenta com o veneno maldoso os que o alimentaram no seio. Vi lá uma colunata horrorosa, em que tudo se referia ao horror e à angústia, como no reino de Deus à paz e ao repouso. Tudo se compreende facilmente, ao vê-lo, mas é quase impossível exprimir tudo em palavras.
Quando
os Anjos abriram as portas, viu-se um caos de contradição, de maldições, de injúrias, de uivos e gritos de dor. Vi Jesus falar à alma de Judas. Alguns dos Anjos prostraram exércitos inteiros de demônios. Todos foram obrigados a reconhecer e adorar Jesus, o que foi para eles o maior suplício. Grande número deles foram amarrados a um círculo, que cercava muitos outros, que deste modo também ficaram presos. No centro havia um abismo de trevas, Lúcifer foi amarrado e lançado nesse abismo, onde vapores negros lhe ferviam em redor. Tudo se fez segundo os decretos divinos. Ouvi dizer que Lúcifer, se não me engano, 50 ou 60 anos antes do ano 2.000 de Cristo, seria novamente solto por certo tempo. Muitas outras datas e números foram indicados, dos quais não me lembro mais. Deviam ser soltos ainda outros demônios antes desse tempo, para provação e castigo dos homens. Creio que também em nosso tempo era a vez de alguns deles e de outros pouco depois do nosso tempo.
É-me impossível contar tudo quanto me foi mostrado; são muitas coisas e não as posso relatar em boa ordem; também me sinto tão doente e quando falo dessas coisas, elas se me representam novamente diante dos olhos e só o aspecto já é suficiente para nos fazer morrer.
Ainda vi exércitos imensos de almas remidas saírem do purgatório e do limbo, acompanhando o Senhor, para um lugar de delícias abaixo da Jerusalém celeste. Foi lá que vi também, há algum tempo, um amigo falecido. A alma do bom ladrão foi também conduzida para lá e viu assim o Senhor no Paraíso, conforme a promessa. Vi que nesse lugar foram preparados banquetes de alegria e conforto, como os tenho visto já muitas vezes, em visões consoladoras.
Não posso indicar com exatidão o tempo e a duração de tudo que se passou, como também não posso contar tudo quanto vi e ouvi lá porque eu mesma não compreendo mais tudo, já porque podia ser mal compreendida pelos ouvintes. Vi, porém, o Senhor em lugares muito diferentes, até no mar, parecia santificar e libertar todas as criaturas; em toda parte fugiam os maus espíritos diante dEle e lançaram-se no abismo. Vi também a alma do Senhor em muitos lugares da terra. Vi-O aparecer no sepulcro de Adão e Eva, sob o Gólgota. As almas de Adão e Eva juntaram-se-lhe novamente; falou-lhes e com elas O vi passar, como sob a terra, em muitas direções e visitar os túmulos de muitos profetas, cujas almas se lhe juntaram, próximo das respectivas ossadas e explicou-lhes o Senhor muitas coisas. Vi-O depois, com esse séquito escolhido, em que seguia também Davi, passar em muitos lugares de sua vida e paixão, explicando-lhes com indizível amor todos os fatos simbólicos que se tinham dado ali e o cumprimento dessas figuras em sua pessoa.
Vi-O especialmente explicar às almas tudo quanto se dera de fatos figurativos no lugar em que foi batizado e contemplei muito comovida a infinita misericórdia de Jesus, que as fez participar da graça de seu santo Batismo.
Causou-me inexprimível comoção ver a alma do Senhor, acompanhada por esses espíritos bem-aventurados e consolados, passar, como um raio de luz, através da terra escura e dos rochedos, pelas águas e pelo ar e pairar tão sereno sobre a terra.
É o pouco de que me lembro ainda, de minha contemplação da descida do Senhor aos infernos e da redenção das almas dos Patriarca
s, depois de sua morte; mas além dessa visão dos tempos passados, vi nesse dia uma imagem eterna de sua misericórdia para com as pobres almas do purgatório. Vi que, em cada aniversário desse dia, lança por meio da Igreja, um olhar de salvação ao purgatório; vi que já no Sábado Santo remiu algumas almas do purgatório, que tinham pecado contra Ele na hora da crucificação.
A primeira descida de Jesus ao limbo é o cumprimento de figuras anteriores e, por sua vez, é a figura da redenção atual. A descida aos infernos que vi, referia-se ao tempo passado, mas a salvação de hoje é uma verdade permanente; pois a descida de Jesus aos infernos é o plantio de uma árvore da graça, destinada a administrar os seus méritos divinos às almas do purgatório e a redenção contínua e atual dessas almas é o fruto dessa árvore da graça no jardim espiritual do ano eclesiástico. A Igreja militante deve cuidar dessa árvore, colher-lhe os frutos, para os outorgar à Igreja padecente, porque essa nada pode fazer em seu próprio proveito. Eis o que se dá em todos os merecimentos de Nosso Senhor; é preciso cooperar, para ter parte neles. Devemos comer o pão ganho com o suor de nosso rosto. Tudo quanto Jesus fez por nós no tempo, dá frutos eternos; mas devemos cultivá-los e colhê-los no tempo, para poder gozá-los na eternidade. A Igreja é como um bom pai de família; o ano eclesiástico é o jardim mais perfeito, com todos os frutos eternos no tempo; em um ano tem bastante de tudo para todos. Ai! dos jardineiros preguiçosos e infiéis, que deixam perder uma graça, que poderia curar um enfermo, fortalecer um fraco, saciar um faminto: no dia de juízo terão de dar conta até do menor pézinho de erva.

1. O jardim e o sepulcro de José de Arimatéia

Esse jardim(14) está situado a cerca de sete minutos do monte Calvário, perto da porta de Belém, na encosta que vai subindo até os muros da cidade; é um belo jardim, com grandes árvores e bancos, em lugares com sombra; de um lado se estende até o muro da cidade, no alto da encosta. Quem vem da porta ao norte do vale, entrando no jardim, tem à esquerda o terreno do jardim, que sobe até o muro da cidade; e vê no fundo do mesmo, à direita, um rochedo isolado, onde é o sepulcro.
Essa porta é de metal, que parece ser cobre e abre em dois batentes que, abertos, se encostam à parede em ambos os lados; não fica perpendicular, mas um pouco inclinada para o nicho e quase tocando o solo, de modo que uma pedra colocada em frente impede de abrí-la. A pedra destinada a esse fim ainda estava fora da gruta e foi colocada à porta fechada só depois de depositado o corpo de Nosso Senhor no sepulcro. É grande e um pouco arredondada para o lado da porta, porque as paredes laterais também não estão em ângulo reto. Para abrir os batentes da porta não é necessário rolar a pedra para fora da gruta, o que seria bastante difícil, por causa da falta de espaço; mas passa-se uma corrente, que pende da abobada, através de algumas argolas, fixas para esse fim na pedra; puxando pela corrente, levanta-se a pedra, mas mesmo assim, só com esforço de vários homens se a desloca, encostando-a à parede lateral.
Em frente à entrada da gruta, há n
o jardim um banco de pedra. Pode-se subir o rochedo do sepulcro e andar sobre a relva de que é coberto; de lá se avista justamente o muro da cidade e também o ponto mais alto de Sião e algumas torres; vê-se também de lá a porta de Belém, um aqueduto e a fonte de Gion. A rocha no interior da gruta é branca, com veios vermelhos e pardos. Toda a obra da gruta foi feita com muito capricho.

2. O descendimento da cruz

Enquanto a cruz ficou abandonada, cercada apenas de alguns guardas, vi cerca de cinco homens, que, vindo de Betânia, desceram pelos vales, aproximaram-se do lugar do suplício, olharam para a cruz e afastaram-se furtivamente; creio que eram discípulos. Havia, porém, dois homens, José de Arimatéia e Nicodemos, que vi três vezes nos arredores, examinando e deliberando; uma vez, durante a crucificação, estavam perto, (talvez quando mandaram comprar as vestes de Jesus da mão dos soldados). Mais tarde estavam lá para ver se o povo já se tinha afastado, indo depois ao sepulcro, para fazer alguns preparativos; do sepulcro voltaram à cruz, olhando para cima e em redor, como se estudassem as condições. Fizeram o plano para o descendimento e voltaram à cidade.
Começaram então a juntar todas as coisas necessárias para o embalsamamento do corpo. Fizeram os servos levar as ferramentas para o descendimento do santo corpo da cruz e além disso, duas escadas, que tiraram de uma granja, perto da casa grande de Nicodemos; cada uma dessas escadas constava apenas de uma estaca, atravessada, de distância em distância, por paus, que serviam de degraus; havia nessas escadas ganchos, que se podiam fixar mais alto ou baixo, seja para prendê-las em qualquer parte, seja para pendurar neles algum objeto necessário, durante o trabalho.
A boa mulher em cuja casa receberam as especiarias para o embalsamamento, tinha-lhes empacotado tudo muito bem, para poderem transportá-las comodamente. Nicodemos comprara 100 arráteis de especiarias, que, segundo o nosso peso, equivale aproximadamente a 16 kilos, como me foi revelado várias vezes. Transportavam parte dessas especiarias em pequenos barris de cortiça, que lhes pendiam do pescoço sobre o peito. Um desses barrizinhos continha um pó. Em bolsas de pergaminho ou de couro levaram pequenos molhos de ervas. José levou também um vaso de ungüento, feito não sei de que material; era vermelho e tinha um aro azul. Os servos, como acima já mencionamos, tinham levado numa padiola: vasos, odres, esponjas e ferramentas. Levaram também fogo, numa lanterna fechada.
Esses servos saíram para o Calvário antes dos senhores e por uma outra porta, creio que pela de Belém. No caminho pela cidade, passaram pela casa à qual tinha ido a Santíssima Virgem, com outras mulheres e com João, afim de buscar algumas coisas necessárias para o embalsamamento do corpo do Senhor e donde saíram, seguindo os servos a pouca distância. Eram talvez cinco mulheres, algumas das quais transportavam grandes fardos de panos sob os mantos. Era costume das mulheres envolver-se cuidadosamente numa longa faixa de pano, da largura de um bom côvado, quando saiam de noite ou quando queriam fazer secretamente uma obra piedosa. Começavam
a enrolar-se por um braço e o pano envolvia-as tão estreitamente, que não podiam dar passos largos; tenho-as visto enrolarem-se assim e o pano chega comodamente para o corpo e o outro braço e ainda para velar a cabeça; nesse dia tinha algo de estranho: era o traje de luto.
José de Arimatéia e Nicodemos também tinham se vestido de luto: as mangas, estolas e cinta larga eram pretas; os mantos, que traziam puxados sobre a cabeça, eram longos e largos e de cor cinzenta. Cobriram tudo que transportavam com esses mantos. Ambos se dirigiram à porta do Calvário.
As ruas estavam desertas e silenciosas; no terror geral todo o povo se conservava em casa, com as portas fechadas. Muitos estavam prostrados por terra, fazendo penitência; só poucos celebraram as cerimônias prescritas para a festa. Quando José e Nicodemos chegaram à porta, encontraram-na fechada e as ruas vizinhas, como os muros da cidade, ocupados por numerosos soldados; eram aqueles que os fariseus tinham requerido, depois de duas horas da tarde, porque temiam uma insurreição. Os soldados ainda não tinham recebido ordem de retirar-se. José apresentou-lhes uma ordem escrita de Pilatos para os deixar passar; os soldados mostraram-se prontos a obedecer a essa ordem, mas disseram-lhes que já haviam experimentado em vão abrir a porta, que provavelmente se deslocara em conseqüência do terremoto; por isso foram também os carrascos obrigados a entrar pela porta Angular, depois de quebrar as pernas dos crucificados. Mas, quando José e Nicodemos puseram as mãos nos ferrolhos, abriu-se a porta com toda a facilidade, com assombro de todos.
O dia ainda estava sombrio, escuro e nebuloso, quando chegaram ao Calvário, onde encontraram os servos que tinham mandado adiante, como também as santas mulheres, que estavam sentadas em frente à cruz, chorando. Cássio e vários soldados que se tinham convertido, estavam como transformados e mantinham-se a alguma distância, tímidos e respeitosos. José e Nicodemos falaram com a Santíssima Virgem e João a respeito de tudo que tinham feito, para salvar Jesus da morte ignominiosa e souberam que só com dificuldade se havia impedido que as pernas de Nosso Senhor fossem quebradas e que assim se tinha cumprido a profecia. Falaram também do golpe da lança, com a qual Cássio abrira o peito de Jesus. Depois de ter chegado também o centurião Abenadar, começaram, com muita tristeza e respeito, a obra piedosa do descendimento e embalsamamento do santo corpo do Senhor, Mestre e Redentor.
A santíssima Virgem e Madalena estavam sentadas ao pé da cruz, à direita, entre a cruz de Dimas e a de Jesus; as outras mulheres estavam ocupadas em arrumar as especiarias e os panos, a água, as esponjas e os vasos. Cássio também se aproximou, quando viu Abenadar chegar e contou-lhe a miraculosa cura de seus olhos. Todos estavam comovidos, cheios de tristeza e amor, mas graves e silenciosos. Às vezes, quando a pressa e atenção à obra santa o permitiam, se ouvia cá e lá, um gemido abafado ou soluço. Sobretudo Madalena, muito exaltada, abandonava-se inteiramente à dor e não se lembrava dos presentes, nem se moderava por qualquer consideração.
Nicodemos e José encostaram as escadas por detrás da cruz, levando, ao subir, um pano largo, no qual estavam presas três largas correias, prenderam o corpo de Jesus, sob os braços e joelhos, ao lenho e seguraram os braços de Nosso Senhor, atando-os pelos pulsos aos madeiros transversais. Depo
is tiraram os cravos, batendo-os por detrás com ponteiros colocados sobre as pontas. As mãos do Senhor não foram muito abaladas pelos golpes do martelo e os cravos caíram facilmente das chagas, que estavam muito alargadas pelo peso do corpo e esse, seguro por meio dos panos, não pendia mais dos cravos. A parte Inferior do corpo que, com a morte, tombara sobre os joelhos, repousava então, em posição natural, sobre um pano, que estava seguro no alto, aos braços da cruz. Enquanto José tirava o cravo e deixava cair cuidadosamente o braço esquerdo sobre o corpo, atou Nicodemos o braço direito do mesmo modo ao da cruz, segurando também a cabeça coroada de espinhos em posição natural, pois caíra sobre o ombro direito; tirou o cravo da mão direita e fez descer o braço, com as respetivas ataduras, ao longo do corpo. Ao mesmo tempo o centurião Abenadar tirou, com grande esforço, o longo cravo dos pés.
Cássio apanhou respeitosamente os cravos e depositou-os aos pés da Santíssima Virgem. José e Nicodemos colocaram então as escadas no lado da frente, próximo do santo corpo, desataram a correia superior do tronco da cruz e sucessivamente as correias, pendurando-as nos ganchos da escada. Descendo então devagar das escadas e passando as correias de gancho em gancho, cada vez mais para baixo, vinha também o santo corpo descendo gradualmente para os braços do centurião Abenadar, que de pé sobre um escabelo, segurou o corpo sobre os joelhos e desceu depois com ele enquanto Nicodemos e José, segurando a parte superior pelos braços, desciam degrau por degrau das escadas, devagar e com todo cuidado, como se transportassem um amigo querido, gravemente ferido. Assim desceu o santo e desfigurado corpo do Salvador da cruz à terra.
O descendimento do corpo da cruz foi um espetáculo indizivelmente tocante. Faziam todos os movimentos com tanto cuidado e carinho, como se receassem causar sofrimento ao Senhor; manifestavam ao santo corpo o mesmo amor e respeito que tinham sentido para com o Santo dos santos, durante a vida. Todos que estavam presentes, não desviavam os olhos do corpo do Senhor e acompanhavam todos os movimentos e manifestavam solicitude, estendendo os braços, derramando lágrimas ou por outros gestos de dor. Mas todos guardavam silêncio; os homens que trabalhavam, penetrados de um respeito involuntário, como quem toma parte num ato religioso, só falavam a meia voz, para chamar a atenção ou pedir qualquer objeto. Quando ressoaram as marteladas que fizeram sair os pregos, Maria Santíssima, Madalena e todos que tinham assistido à crucificação, sentiram de novo as dores dilacerantes daquela hora; pois esses golpes lhes lembravam as dores cruéis de Jesus causadas pelas marteladas e todos estremeceram, pensando ouvir-Lhe novamente os gemidos penetrantes e contudo se afligiam de que a santa boca Lhe houvesse emudecido, no silêncio da morte. Depois de descer o santo corpo, os homens o envolveram dos joelhos até os quadris e depositaram-no sobre um pano, nos braços da Mãe Santíssima, que lhos estendeu, cheia de dor e saudade.

3. O corpo de Jesus é preparado para a sepultura

A Santíssima Virgem estava sentada sobre uma coberta, estendida sobre a terra; o joelho direito, um pouco elevado, como também as costas, apoiavam-se-lhe sobre uma almofada, feita de man
tos enrolados; fizeram esse arranjo para facilitar à Mãe, exausta de dor e cansaço, a triste obra de caridade que ia fazer, para com o santo corpo do Filho querido, cruelmente assassinado. A santa cabeça de Jesus, um pouco curvada, estava encostada ao joelho de Maria; o corpo jazia estendido sobre o pano. Igualavam-se a dor e o amor da Virgem Santíssima. Tinha de novo nos braços o corpo do Filho adorado, a quem durante tão longo martírio não pudera testemunhar seu amor; via quanto estava desfigurado o santo corpo, pelas horríveis crueldades, via-lhe de perto as feridas, beijava-lhe as faces sangrentas, enquanto Madalena jazia prostrada por terra, com o rosto sobre os pés de Jesus.
Os homens retiraram-se então para um pequeno vale, situado a sudoeste, na encosta do Calvário, onde tencionavam terminar o embalsamamento e arrumaram tudo quanto era necessário para esse fim. Cássio, com um grupo de soldados que se tinham convertido, mantinha-se a respeitosa distância; toda a gente inimiga do Mestre tinha já voltado para a cidade e os soldados ainda presentes ficaram para servir de guarda e impedir que alguém viesse perturbar as últimas honras prestadas a Jesus. Alguns ajudavam, comovidos e humildes, prestando pequenos serviços, quando lhes pediam.
Todas as santas mulheres ajudavam, onde era preciso, passando os vasos com água, esponjas, panos, ungüentos e especiarias ou mantinham-se atentas a certa distância. Entre elas se achavam Maria, filha de Cleofas, Salomé e Verônica; Madalena estava sempre ocupada com o santo corpo; Maria Helí, a irmã mais velha da Santíssima Virgem, senhora já idosa, estava sentada silenciosa, João estava sempre ao lado da Santíssima Virgem, pronto a prestar-lhe qualquer auxílio; era o mensageiro entre as mulheres e os homens; ajudava àquelas e depois prestou também muitos serviços aos homens, durante o embalsamamento. Estava tudo muito bem preparado; as mulheres trouxeram odres de couro, que se podiam abrir e dobrar e um vaso com água, que estava sobre uma fogueira de carvão. Trouxeram a Maria e a Madalena tigelas com água e esponjas limpas, espremendo as usadas e despejavam a água usada nos odres de couro. Creio, pelo menos, que os chumaços redondos que as vi espremerem, eram esponjas.
A Santíssima Virgem conservava um ânimo forte, em toda a sua indizível dor;(15) mesmo em sua tristeza não podia deixar o santo corpo no horrendo estado em que o pusera o ignominioso suplício e assim começou, com atividade infatigável, a lavá-lo cuidadosamente. Abrindo a coroa de espinhos pelo lado posterior, tirou-a cuidadosamente da cabeça de Jesus, com auxílio dos outros. Para que os espinhos que entraram na cabeça, não alargassem as feridas, foi preciso cortá-los um a um da coroa. Colocaram depois a coroa junto aos cravos, ao lado, e Maria tirou alguns espinhos compridos e fragmentos que tinham ficado na cabeça do Salvador, com uma espécie de pinças curvas e elásticas, de cor amarela e mostrou-os tristemente aos amigos compassivos. Puseram os espinhos junto à coroa; mas é possível que alguns fossem guardados como lembrança.
Quase não se podia mais reconhecer o rosto do Senhor, tão desfigurado estava pelas feridas e pelo sangue. O cabelo e a barba, em desalinho, estavam completamente colados pelo sangue. Maria lavou-lhe o rosto e a cabeça, passando esponjas molhadas sobre o cabelo, para tirar o sangue que secara. A medida que lavava, tornavam-se mais visíveis os efeitos do cruel suplício, causando cada vez novas manifestações de compaixão, novos cuidados, de ferida em ferida. Maria limpou-lhe as fe
ridas da cabeça, lavou o sangue dos olhos, das narinas e dos ouvidos, com uma esponja e um pequeno lenço, estendidos sobre os dedos da mão direita; com esse limpou também a boca entreaberta, a língua, os dentes e os lábios de Nosso Senhor. Dispôs o pouco que restava da cabeleira de Jesus em três partes, uma para cada lado e uma para o lado posterior da cabeça e depois de alisar os cabelos de ambos os lados, fê-los passar por trás das orelhas. Quando acabou de limpar a cabeça, deu-Lhe um beijo na face e cobriu o santo rosto. Dirigiu então os cuidados ao pescoço, aos ombros, ao peito e às costas do santo corpo, aos braços e às mãos laceradas e sangrentas. Ai! Então se viu toda a horrenda dilaceração do santo corpo. Todos os ossos do peito e todas as articulações estavam deslocadas e tornaram-se inflexíveis; o ombro sobre o qual Jesus transportou a pesada cruz, era uma grande chaga; toda a parte superior do corpo estava coberta de feridas e pisaduras, causadas pela flagelação; no lado esquerdo se via uma ferida pequenina, onde saíra a ponta da lança e no lado direito se abria a larga chaga feita pela mesma lança, que também lhe traspassou o coração de lado a lado. Maria Santíssima lavou e limpou todas essas feridas. Madalena, prostrada de joelhos, ficava-lhe às vezes em frente, para a ajudar, mas quase sempre estava aos pés de Jesus, os quais lavou então pela última vez, mais com as lágrimas do que com água, enxugando-os com o cabelo.
A cabeça, o peito e os pés do Senhor foram assim limpos do sangue e de toda a imundície; o corpo, de um branco azulado, com o brilho de carne exangue, coberto de manchas pardas e de outros lugares vermelhos, onde a pele fora arrancada, repousava sobre os joelhos de Maria, que lhe envolvia os membros lavados e se pôs a embalsamar todas as feridas, começando novamente pela cabeça. As santas mulheres ajoelhavam-se alternadamente diante dela, apresentando-lhe um vaso, do qual, com o indicador e o polegar da mão direita, tirava um bálsamo ou ungüento precioso, com que ungia e untava todas as feridas. Derramou também ungüento sobre o cabelo; vi que, segurando as mãos de Jesus com a mão esquerda, as beijou respeitosamente e encheu as largas chagas dos cravos com o mesmo ungüento ou as mesmas especiarias de que enchera os ouvidos as narinas e a chaga do lado. Madalena estava quase todo o tempo ocupada com os pés de Jesus, ora enxugando e untando-os, ora banhando-os novamente com as lágrimas; muitas vezes apoiava neles o rosto.
Vi que não despejavam fora a água usada, mas guardavam-na nos odres de couro, nos quais também espremiam as esponjas. Vi diversas vezes que Cássio e outros soldados foram buscar água à fonte de Gion, em odres e jarros, que as mulheres tinham trazido; essa fonte de Gion estava tão perto, que se podia enxergá-la do jardim do sepulcro.
Quando a Santíssima Virgem acabou de untar todas as feridas, envolveu a santa cabeça em faixas; mas ainda não pôs o lenço que devia cobrir-lhe o rosto. Fechou-lhe os olhos entreabertos, pousando sobre eles a mão por algum tempo; fechou também a boca do Senhor, abraçou o santo corpo do Filho e, chorando, deixou cair o rosto sobre o de Jesus. Madalena, pelo grande respeito que tinha ao Senhor, não lhe tocou no semblante, mas apenas descansou o rosto sobre os pés do santo corpo.
José e Nicodemos já tinham estado por algum tempo perto, esperando, quando João se aproximou da Santíssima Virgem, pedindo que se separasse do corpo de Jesus, para que o pudessem preparar para a sepultura, porque o sábado já estava perto. Maria abraçou mais um
a vez, com o maior fervor, o corpo do Filho adorado, despedindo-se dele com palavras comoventes. Então levantaram os homens o santo corpo no pano em que jazia, sobre os joelhos da Mãe Santíssima e levaram-no para o lugar do embalsamamento. A Virgem Santíssima, novamente entregue à dor, para a qual tinha achado alguma consolação nos piedosos cuidados, caiu, com a cabeça velada, nos braços das mulheres; Madalena, porém, seguiu os homens, correndo-lhes alguns passos atrás, com os braços estendidos, como se lhe quisessem raptar o Amado, mas voltou depois para junto da SS. Virgem.
Levando o santo corpo, os homens desceram um pouco do alto do Gólgota, para um lugar, numa dobra da encosta, onde havia uma pedra chata e lisa, própria para esse fim. Ali já tinham feito todos os preparativos para o embalsamamento. Vi primeiro, ali estendido, um pano trabalhado a crivo, semelhante a uma rede, como que feita de rendas; parecia-se com o grande pano de fome(16), que se pendura em nossas igrejas.
Quando criança, pensava eu sempre, ao ver esse pano, que era o mesmo que vi no embalsamamento do Senhor. Provavelmente tinha o feitio de uma rede, para deixar escorrer a água, ao lavar. Vi mais um pano grande, estendido sobre a pedra. Deitaram o corpo do Senhor sobre o primeiro e alguns seguravam o outro por cima. Nicodemos e José de Arimatéia ajoelharam-se e desataram, sob essa coberta, o lençol em que tinham envolvido o ventre do Senhor, ao descê-Lo da cruz. Depois tiraram também do santo corpo a cinta que Jonadab, sobrinho do pai nutrício do Salvador, lhe trouxera antes da crucifixão. Lavaram então o ventre do Senhor com esponjas, sob o pano com que o cobriam, com piedoso recato e que o tornava invisível aos seus olhos. Coberto ainda com o pano, levantaram-nO depois, por meio de outros panos, passados sob os braços e joelhos e assim lhe lavaram também as costas, sem virar o corpo. Continuavam a lavar, até que a água espremida das esponjas escorria clara e limpa. Depois o lavaram ainda com água de mirra e vi que depuseram o santo corpo sobre a pedra, estendendo-o respeitosamente com as mãos, dando-lhe uma posição reta, pois o meio do corpo e as pernas estavam ainda um pouco curvas, entesadas, na posição em que se encolhera, morrendo. Puseram-Lhe então sob os lombos um pano da largura de um côvado e cerca de três côvados de comprimento, enchendo-lhe o seio de molhos de ervas, - como vejo às vezes em banquetes celestes, ervas verdes em pratos de couro, com borda azul, - e de fibras finas e crespas de plantas parecidas com açafrão e sobre tudo isso espalharam um pó fino, que Nicodemos trouxera num vaso. Envolveram depois o ventre, com todas essas especiarias, no pano, puxaram uma parte deste, por entre as pernas, para cima e fixaram-na sobre o ventre, fazendo entrar a extremidade do pano por baixo do cinto. Depois de O ter deste modo envolvido, ungiram todas as chagas das coxas, cobriram-nas de especiarias, puseram molhos de ervas entre as pernas, até os pés e enrolaram as pernas junto com as ervas, de baixo para cima.
Então foi João chamar a Santíssima Virgem e as outras santas mulheres. Maria ajoelhou-se ao lado da cabeça, colocando sob essa um lenço fino, que recebera de Cláudia Prócula, mulher de Pilatos e que trouxera ao pescoço, sob o manto. Ela e as outras santas mulheres encheram então os espaços entre a cabeça e os ombros, em redor do pescoço, até às faces de Jesus, com molhos de ervas, com as fibras e o pó fino e feito isso, a Santíssima Virgem atou tudo com aquele pano, envolvendo cabeça e ombros. Madalena derramou ainda um frasco inteiro de um líquido aromático na ferida do lado de Jesus e as santas mulheres puseram-lhe ainda ervas e especiaria
s nas mãos e em redor dos pés. Os homens puseram especiarias nas axilas, na cova estomacal, enchendo todo o espaço em redor do corpo, cruzaram sobre o seio os santos braços entorpecidos e envolveram finalmente todo o corpo, junto com as especiarias, no grande pano branco, até o peito, como se enfaixa uma criança; depois fizeram entrar sob um dos braços já enfaixados a extremidade de uma faixa, com a qual enrolaram todo o corpo, levantando-o e começando pela cabeça. Feito isto, puseram-no sobre o pano grande, de seis côvados de comprimento, o qual José de Arimatéia comprara e nele o envolveram. O corpo jazia obliquamente sobre o pano, do qual dobraram uma extremidade dos pés até o peito, a outra, de cima, sobre a cabeça e ombros; com as partes salientes dos lados envolveram o meio do corpo.
Todos se ajoelharam então em redor do corpo, para se despedirem, chorando e eis que um milagre comovente se lhes deparou ante os olhos: Toda a figura do santo corpo, com todas as feridas, apareceu na superfície do pano que o cobria, desenhado em cor vermelho-escura, como se Jesus quisesse recompensar-lhes os cuidados carinhosos e a tristeza, deixando-lhes o retrato, através de todo o invólucro. Chorando alto, abraçaram o santo corpo, beijando e venerando a milagrosa imagem. A admiração de que estavam possuídos, era tão grande, que de novo abriram o pano e tornou-se ainda maior, quando acharam todas as faixas e ataduras do corpo brancas como dantes; só o pano exterior trazia a imagem da figura do Senhor.
A parte do pano sobre a qual jazia o corpo, mostrava o desenho do dorso do Senhor e os lados do pano que o cobriam, sobrepostos, apresentavam a imagem da frente, porque na frente estava o pano dobrado sobre Ele, com vários cantos. A imagem não dava a impressão de feridas sangrentas, pois todo o corpo estava envolto espessamente em especiarias, com muitas ataduras; era, porém, uma imagem milagrosa, testemunho da divindade criadora, que permanecera unida ao corpo de Jesus.
Vi também muitos fatos da história posterior dessa santa mortalha, os quais, porém, não sei mais contar na devida ordem. Ela estava, junto com outros panos, na posse dos amigos de Jesus, depois da ressurreição. Uma vez vi que foi arrancada a uma pessoa, que a levava sob o braço. Vi-a duas vezes nas mãos de judeus, mas também muito tempo em diversos lugares, venerada pelos cristãos. Uma vez houve uma questão por causa dela e para a terminar, jogaram a mortalha no fogo, mas foi milagrosamente levada pelos ares e caiu nas mãos de um cristão.
Foram feitas três cópias da santa imagem, por santos homens, que puseram outros panos em cima, com fervorosa oração, reproduzindo assim tanto a figura do dorso, como também a imagem composta da frente. Essas cópias foram consagradas pelo contato na intenção solene da Igreja e em todos os tempos têm sido instrumento de muitos milagres. O original vi uma vez, um pouco estragado, com alguns rasgões, na Ásia, venerado por cristãos não católicos. Esqueci o nome da cidade, que fica situada num vasto país, vizinho da terra dos Reis Magos. Vi nessas visões também certas coisas de Turim e da França, do Papa Clemente I e do imperador Tibério, que morreu cinco anos depois da morte de Cristo; mas esqueci-as.

4. O enterro

Os homens colocaram o santo corpo sobre a padiola de couro, cobriram-no com uma coberta parda e enfiaram em cada lado um varal, o qual me causou uma viva recordação da Arca da Aliança. Nicodemos e José carregavam as extremidades anteriores dos varais sobre os ombros; atrás seguravam Abenadar e João. Depois se seguiam a Santíssima Virgem, sua irmã mais velha, Maria Helí, Madalena e Maria de Cleofas e após elas, o grupo das mulheres que dantes estavam um pouco mais afastadas: Verônica, Joana Cuza, Maria Marcos (mãe de Marcos), Salomé Zebedaei, Maria Salomé, Salomé de Jerusalém, Susana e Ana, sobrinha de S. José, educada em Jerusalém. Encerravam o séquito Cássio e os soldados. As outras mulheres, por exemplo Maroni, de Naim, Dina, a Samaritana e Mara, a Sufamita, estavam então em Betânia, em casa de Marta e Lázaro.
Dois soldados, com fachos torcidos, iam na frente, pois precisavam de luz na gruta do sepulcro. Cantando salmos, em tom triste e baixo, caminharam cerca de sete minutos, através do vale, em direção ao jardim do sepulcro. Vi na encosta, além do vale, Tiago o Maior, irmão de João, olhar o cortejo e voltar depois, para o anunciar aos outros discípulos, refugiados nas cavernas.
O jardim irregular, coberto de relva, que ficava diante do rochedo da gruta, na extremidade do jardim, era cercado de uma sebe e além desta tinha na entrada uma cancela, cujas trancas, com gonzos de ferro, estavam fixas em estacas. Defronte da entrada do jardim, diante do rochedo do sepulcro, à direita, há várias palmeiras. A maior parte das outras plantas são arbustos, flores e ervas aromáticas.
Vi o cortejo parar na entrada do jardim e abrir a cancela, tirando algumas trancas, das quais se serviram depois, como alavancas, para fazer rolar para dentro da gruta a grande pedra que devia fechar o sepulcro. Chegando ao pé do rochedo, abriram a padiola e tiraram o santo corpo, deitando-o sobre uma tábua estreita, coberta de um largo pano. Nicodemos e José carregaram as duas extremidades da tábua, enquanto os outros dois seguravam o pano. A nova gruta sepulcral fora limpa e perfumada pelos criados de Nicodemos; era bem graciosa e no alto das paredes interiores tinha um friso esculpido. A cova mortuária era, no lugar da cabeça, um pouco mais larga do que no lugar dos pés e havia sido escavada na forma côncava de um cadáver amortalhado, com pequenas elevações no lugar da cabeça e dos pés.
As santas mulheres assentaram-se em frente à entrada da gruta. Os quatro homens desceram com o santo corpo do Senhor à gruta, onde o depuseram no chão; encheram ainda parte do leito sepulcral de especiarias, estenderam sobre ele um pano, colocando sobre este o santo corpo. O pano pendia ainda dos lados do sepulcro. Manifestando ao santo corpo o seu amor com lágrimas e abraços, saíram da gruta. Entrou então a Santíssima Virgem. Sentou-se à cabeceira de Jesus, à beira do sepulcro, que tinha cerca de dois pés de altura e inclinou-se, chorando, sobre o cadáver do Filho. Depois de Maria Santíssima sair, entrou Madalena, com ramos e flores, que colhera no jardim e que espalhou sobre o santo corpo. Torcendo as mãos e chorando alto, abraçou os pés de Jesus. Como, porém, os homens lá fora insistissem em fechar o sepulcro, voltou para junto das mulheres. Os homens dobraram sobre o santo corpo a parte pendente do pano, cobriram tudo com
uma coberta parda e fecharam as portas. Puseram uma barra transversal e uma perpendicular; parecia uma cruz.
A grande pedra destinada a fechar as portas do sepulcro e que ainda estava fora da gruta, tinha uma forma semelhante a uma arca(17) ou um monumento sepulcral; um homem podia deitar-se sobre ela. Era muito pesada e os homens rolaram-na para dentro da gruta, com auxílio das trancas tiradas da cancela do jardim e encostaram-na às portas fechadas do sepulcro. A entrada exterior da gruta foi fechada com uma porta de ramos entrelaçados.
Todos os trabalhos dentro da gruta foram feitos à luz de fachos, porque dentro estava muito escuro. Durante o enterro do Senhor, vi vários homens na proximidade do jardim e do Monte Calvário, que, tímidos e tristes, andavam de um lado para outro; creio que eram discípulos, que receberam de Abenadar notícias e, saindo das cavernas, aproximaram-se através do vale e àquela hora estavam voltando.

5. A volta para casa, depois do enterro; o sábado; prisão de José de Arimatéia

Já era a hora em que começava o sábado. Nicodemos e José voltaram à cidade, passando por uma pequena porta que havia no muro da cidade, perto do jardim e que, se bem me lembro, lhes era concedida por favor particular. Disseram à Santíssima Virgem, a João, Madalena e algumas mulheres que ainda queriam ir ao Monte Calvário, para rezar e buscar algumas coisas ali deixadas, que essa porta, como também o portão para o Cenáculo, lhes seriam abertos, se batessem. Maria Helí, a irmã já idosa da Santíssima Virgem, foi conduzida à cidade por Maria Marcos e outras mulheres. Os criados de Nicodemos e José voltaram ao Monte Calvário, para buscar os utensílios que lá tinham deixado.
Os soldados reuniram-se àqueles que ocupavam a porta que dava para o Monte Calvário; Cássio seguiu para o palácio de Pilatos, levando a lança e relatou-lhe tudo que acontecera, prometendo também lhe dar notícias exatas de tudo quanto ainda sucedesse, se o mandasse acompanhar a guarda do sepulcro, a qual os judeus, segundo fora informado, viriam requerer-lhe. Pilatos escutou todas as informações com um oculto terror, tratou-o, porém, como fanático e com nojo e medo supersticioso da lança que Cássio trouxera consigo, mandou-lhe que a levasse para fora da sala.
Quando a Santíssima Virgem e os amigos voltavam com os utensílios do Monte Calvário, onde ainda tinham rezado e chorado, viram um destacamento de soldados que lhes vinha ao encontro; retiraram-se então para os dois lados do caminho, para deixar passar a tropa. Esta se dirigiu ao Monte Calvário, provavelmente para tirar, ainda antes do sábado, as cruzes e enterrá-las. Depois de terem passado, as santas mulheres continuaram o caminho em direção à pequena porta da cidade.
José e Nicodemos encontraram-se na cidade com Pedro, Tiago o Maior e Tiago o Menor. Todos estavam chorando. Pedro especialmente estava muito triste, preso de vio
lenta dor; abraçou-os soluçando, acusou-se a si mesmo, lastimando não ter estado presente à morte do Senhor e agradeceu-lhes terem dado sepultura ao corpo sagrado. Todos estavam desvairados de dor. Pediram ainda para serem recebidos no Cenáculo, quando batessem e despediram-se, para procurar ainda outros discípulos dispersos.
Vi mais tarde a Santíssima Virgem e as amigas baterem à porta do Cenáculo e serem recebidas, como também Abenadar e, pouco a pouco, os demais Apóstolos e vários discípulos. As santas mulheres retiraram-se para a parte onde habitava a Santíssima Virgem; tomaram um pouco de alimento e passaram ainda alguns minutos, recordando com tristeza e dor tudo o que se tinha passado. Os homens revestiram-se de outras vestes e vi-os começarem o sábado de pé, sob um candeeiro. Depois comeram ainda carne de cordeiros, em diversas mesas, no Cenáculo, mas sem cerimônias; pois não era o cordeiro pascal, que já tinham comido na véspera. Reinava tristeza e desânimo geral. Também as santas mulheres rezavam com Maria, à luz de um candeeiro. Mais tarde, quando já escurecera totalmente, foram ainda recebidos Lázaro, Marta, Maroni, a viúva de Naim, Dina Sumarites e Maria Sufanites, que depois de começar o sábado, vieram da Betânia e a dor renovou-se pela narração de tudo que se passara.
Mais tarde saíram José de Arimatéia e alguns discípulos e diversas mulheres do Cenáculo, voltando para casa; iam tímidos e tristes pelas ruas de Sião, quando de repente um grupo de homens armados saiu de uma emboscada, arremessando-se sobre eles e prendendo José de Arimatéia, enquanto os outros fugiram com gritos de terror. Vi encarcerarem o bom José numa torre do muro da cidade, não muito longe do tribunal. Caifás mandara soldados pagãos executarem essa prisão, porque não eram obrigados a guardar o sábado. Os inimigos tinham a intenção de deixar José morrer de fome e não falar nesse desaparecimento.

6. A guarda no túmulo de Jesus

Na noite de sexta-feira para sábado vi Caifás e os príncipes dos judeus reunirem-se em conselho, para decidir o que deviam fazer, diante dos acontecimentos milagrosos e da excitação do povo. Depois foram ainda durante a noite, procurar Pilatos e disseram-lhe que se tinham lembrado de que aquele impostor tinha dito, quando ainda vivia, que no terceiro dia após a morte ressuscitaria; pediam-lhe que por isso mandasse guardar o sepulcro até o terceiro dia, para que os discípulos de Jesus não lhe roubassem o corpo, divulgando em seguida que tinha ressuscitado dos mortos, pois dessa forma seria a segunda impostura pior do que a primeira.
Pilatos, porém, não quis intrometer-se mais nessa questão e disse-lhes: “Tendes uma guarda; ide guardar o túmulo como entenderdes.” Mandou, porém, Cássio acompanhar a guarda e observar e relatar-lhe depois tudo. Vi os doze fariseus saírem da cidade, antes do pôr do sol. Os doze soldados que os acompanhavam, não estavam vestidos à forma romana: eram soldados do Templo e pareciam-me uma espécie de guarda de corpo. Levaram braseiros, fixos sobre hastes, para poder ver tudo durante a noite e para ter luz na escuridão do sepulcro.
Ao chegar, certificaram-se da presença do corpo, amarraram uma corda à porta do túmulo, dessa corda fizeram passar uma segunda à pedra, selando essas cordas com um selo semilunar. Depois voltaram à cidade e os guardas sentaram-se defronte da porta exterior do sepulcro. Ficavam alternadamente cinco ou seis homens, indo de vez em quando alguns à cidade, para buscar víveres. Cássio, porém, não deixou o posto; permanecia em pé ou sentado, no fosso em frente à entrada da gruta, de modo que podia ver o lado do túmulo fechado, onde repousavam os pés do Senhor. Recebeu grandes graças interiores e a inteligência intuitiva de muitos mistérios; como não estivesse acostumado a tais estados sobrenaturais, ficava, a maior parte do tempo dessa iluminação espiritual, como que embriagado, inconsciente das coisas exteriores. Foi nesse tempo que se converteu inteiramente, tornando-se novo homem; passou o dia em atos de arrependimento, ação de graças e adoração.

7. Os amigos de Jesus no Sábado santo

Vi à noite, como já mencionei, os homens reunidos no Cenáculo, cerca de vinte, de vestes longas e brancas e cingidos, celebrando o sábado, à luz de um candeeiro e depois de comer, separaram-se para dormir. Diversos foram para casa. Também hoje os vi reunidos no Cenáculo, na maior parte do tempo em silêncio, rezando e lendo alternadamente e de vez em quando deixando entrar alguns que chegavam.
No local onde ficava a Santíssima Virgem, havia uma grande sala e nessa alguns recantos separados por biombos ou tapetes, para servirem de quartos de dormir. Depois que as santas mulheres, voltando do sepulcro, tinham posto todos os utensílios nos respectivos lugares, acendeu uma delas um candeeiro, que pendia no centro da sala. Reuniram-se sob este candeeiro, em roda da Santíssima Virgem, rezando alternadamente, com grande devoção e tristeza. Depois tomaram algum alimento. Entraram na sala Marta, Maroni, Dina e Mara, que depois de começar o sábado, tinham vindo de Betânia, com Lázaro, que se juntou aos homens reunidos no Cenáculo. Contaram chorando aos recém-chegados a morte e a sepultura do Senhor e como já era tarde, alguns dos homens, entre os quais José de Arimatéia, mandaram chamar as mulheres que queriam voltar para suas casas na cidade e despediram-se. Ao voltar este grupo para casa, José foi preso, perto do tribunal de Caifás, como já contei e encarcerado numa torre.
As mulheres que ficaram no Cenáculo, separaram-se então, indo para as mencionadas celas de dormir; puseram panos compridos sobre a cabeça e por algum tempo ali permaneceram sentadas no chão, em triste silêncio, encostadas às cobertas, que estavam enroladas ao pé da parede. Depois se levantaram, desenrolaram as cobertas, tiraram as sandálias, cintas e parte do vestuário, velaram-se da cabeça aos pés, como costumam fazer para dormir e deitaram-se para um curto descanso, sobre as cobertas estendidas; pois logo depois de meia noite se levantaram de novo, arrumaram a roupa, enrolaram os leitos e reuniram-se sob o candeeiro, em roda da Santíssima Virgem, para rezarem alternadamente. Tenho visto muitas vezes filhos fiéis de Deus e homens santos, desde que se reza neste mundo, observarem esse costume de orações noturnas,
seja inspirados por uma graça pessoal, seja incitados por preceitos divinos e eclesiásticos.
Depois da Mãe de Jesus e as amigas terem cumprido esse dever de oração noturna, apesar dos grandes sofrimentos e depois de terem também os homens rezado no Cenáculo, à luz do candeeiro, bateu João, com alguns outros discípulos, à porta da sala das mulheres, que se envolveram imediatamente nos mantos e os seguiram, junto com a Santíssima Virgem, ao Templo.
Vi a Santíssima Virgem, as santas mulheres, João e outros discípulos chegarem ao Templo, quase ao mesmo tempo em que o sepulcro era selado: cerca de três horas da manhã. Era costume de muitos judeus, de madrugada, depois de ter comido o cordeiro pascal, irem ao Templo, que nessa ocasião já era aberto à meia noite, porque começavam os sacrifícios de manhã muito cedo. Naquele dia, porém, estava tudo em desordem, pela interrupção da festa e pela profanação do Templo. Parecia-me que a Santíssima Virgem, com as amigas, queria somente se despedir do Templo, no qual tinha sido educada, adorando o Santíssimo, até trazer no seio o próprio Santíssimo, que agora fora tão cruelmente imolado, como verdadeiro Cordeiro pascal. O Templo estava aberto, segundo o hábito desse dia e iluminado por lampiões e até o átrio dos sacerdotes era acessível ao povo, fora os guardas e empregados, como de costume nessa manhã. Mas, lá não havia nenhum fiel. Tudo estava ainda em desordem e devastado pelas terríveis destruições do dia precedente. O Templo estava profanado pela aparição de mortos e eu não podia deixar de perguntar a mim mesma: “Como poderão reparar tudo isto?”
Os filhos de Simeão e os sobrinhos de José de Arimatéia, que estavam muito tristes com a notícia da prisão do tio, encontraram-se com a Santíssima Virgem e os companheiros e conduziram-nos por todas as partes do Templo, do qual eram guardas. Viram silenciosos e assustados toda a destruição, adorando o testemunho divino; só de vez em quando os guias descreviam acontecimentos do dia anterior.
Vi em muitos lugares prejuízos causados pelo terremoto da véspera, que ainda não haviam sido consertados. No ponto onde se juntam o átrio e o Santo do Templo, havia tão larga fenda no muro, que um homem podia passar através e havia perigo dos muros caírem. A verga por cima da cortina, diante do Santo, abaixara, as colunas que a suportavam, cederam para os lados e a cortina pendia de ambos os lados, rasgada de cima a baixo, em duas partes. Pela grossa pedra caída do muro norte do Templo, perto da cela de oração de Simeão, também destruída, formara-se tão grande abertura, no lugar onde aparecera Zacarias, que as santas mulheres puderam passar sem dificuldade e do outro lado, perto da cátedra em que o Menino Jesus ensinara, ver, através da cortina rasgada, o Santo, o que em outros tempos era proibido. Também se fenderam aqui e acolá os muros, afundaram-se partes do solo, umbrais e colunas saíram do lugar.
A SS. Virgem visitou, com os amigos, todos os lugares que lhe eram sagrados, pela lembrança de Jesus. Prostrando-se por terra, beijava os santos lugares, chorando e contava as suas reminiscências, em poucas palavras comovedoras. Também as companheiras faziam o mesmo.
Os judeus têm grande veneração por todos os lugares onde aconteceu alguma coisa que lhes parece sobrenatural; toc
am e beijam esses lugares e deitam-se por terra, tocando-a com o rosto. Nunca achei nisso coisa de admirar. Se sabemos, cremos e sentimos que o Deus de Abraão, Isaac e Jacó é Deus vivo e mora no meio do seu povo, no Templo, na sua casa em Jerusalém, devíamos admirar-nos antes, se não o fizessem. Quem crê em Deus vivo, Pai e Redentor e Santificador dos homens, seus filhos, não se admira que Ele esteja com amor vivo entre os vivos e que estes lhe prestem amor, honra e adoração, bem como a tudo quanto se lhe refere, mais do que aos pais terrestres, amigos, mestres, superiores e príncipes. Os judeus sentiam no Templo e nos lugares sagrados o que sentimos diante do SS. Sacramento. Mas também entre os judeus havia cegos e “iluminados”, como há também entre nós, que não adoram o Deus vivo e realmente presente, mas se entregam ao culto supersticioso dos ídolos deste mundo. Não se lembram das palavras de Jesus: “Quem me negar diante dos homens, também o negarei diante de meu Pai Celestial.” Tais homens, que servem ao espírito e à mentira do mundo, em pensamentos, palavras e obras, sem interrupção, mas rejeitam todo o culto externo de Deus, dizem às vezes, se por ventura ainda não rejeitaram o próprio Deus, como demasiadamente exterior: “Adoramos a Deus em espírito e verdade”; mas não sabem o que isso significa: no Espírito Santo e no Filho, que nasceu de Maria Virgem, que deu testemunho da verdade e viveu entre nós, que morreu por nós neste mundo e quer ficar presente na sua Igreja, no SS. Sacramento, até o fim dos séculos.
A SS. Virgem visitou assim muitos lugares do Templo, venerando-os religiosamente. Mostrou-lhes onde entrara a primeira vez no Templo, quando menina e onde fora educada, na parte sul do edifício, até o casamento. Mostrou-lhes onde desposara São José, onde apresentara Jesus, onde Simeão e Ana proferiram a profecia; nesse lugar chorou amargamente, pois a profecia estava cumprida; a espada transpassara-lhe o coração. Mostrou-lhes onde achara o Menino Jesus ensinando no Templo e beijou respeitosamente a cátedra. Visitaram também a caixa de esmolas, onde a viúva depositara a esmola e o lugar onde o Senhor perdoara à adúltera. Depois de ter deste modo venerado todos os lugares santificados pela presença de Jesus, com recordações, beijos, lágrimas e orações, voltaram a Sião.
De volta, ao amanhecer, no Cenáculo de Sião, Maria e as companheiras se dirigiram à sua habitação separada, situada à direita do pátio da casa. Na entrada se separaram delas João e outros discípulos e foram juntar-se aos homens que, em número de cerca de vinte, permaneciam reunidos, de luto, no Cenáculo, durante todo o sábado, rezando alternadamente, sob a luz do candeeiro. Vi-os também de vez em quando receberem timidamente alguns recém-chegados, conversando com eles e chorando. Todos mostravam íntimo respeito e certa vergonha diante de João, que ficara com Jesus até à morte. João, porém, era benévolo e afetuoso para com todos e simples como uma criança, tratava a todos com humildade. Vi-os também uma vez tomar uma refeição. Fora disso estavam silenciosos e a casa permanecia fechada. Também não podiam ser inquietados ali, pois a casa pertencia a Nicodemos e haviam-na alugado para a refeição pascal.
Vi depois as santas mulheres reunidas na sala escura, iluminada apenas pela luz do candeeiro, pois as portas e janelas estavam fechadas. Ora se juntavam em roda da SS. Virgem, para a oração, ora se retiravam para suas celas separadas, cobrindo a cabeça com o véu de luto e sentavam-se sobre caixas chatas, cobertas de cinza, em sinal de luto, ou rezavam, com o rosto voltado para a parede. Sempre que se reuniam para rezar, deixavam o véu de luto nas respectivas cela
s. Vi também as mais fracas tomarem algum alimento, as outras, porém, jejuavam.
Contemplei-as diversas vezes e sempre as vi rezando ou de luto, do modo por que descrevi. Unindo minha contemplação aos pensamentos da SS. Virgem, que estava mergulhada na recordação de Nosso Salvador, vi várias vezes o santo sepulcro e cerca de sete guardas, que permaneciam em frente à entrada, em pé ou sentados. Perto da porta da gruta, no fosso que ali havia, estava Cássio em silêncio e profunda meditação. Vi as portas do sepulcro fechadas e a pedra encostada. Através das portas, porém, vi o corpo do Senhor, jazendo ainda como fora depositado, cercado de luz, entre dois Anjos em adoração.




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